quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

O que valem os horóscopos?


Numa semana do ano em que muitas pessoas recorrem às "previsões astrológicas" para 2023, reproduzimos a parte principal de um interessante artigo do neurocientista Jorge Almeida, publicado na edição de 27.12.2023 do jornal "Público":

O que valem os horóscopos?

(…) Qual golpe de magia bem orquestrado, os horóscopos (e outras coisas que tal) casam às mil maravilhas com a nossa necessidade de, como seres humanos, procurarmos explicações para as coisas do nosso dia-a-dia.

É aqui que entra a psicologia e a ciência cognitiva, o estudo das heurísticas que a nossa mente usa para facilitar o processo de compreender o nosso mundo, e os erros cognitivos (a que chamamos vieses cognitivos) que decorrem da necessidade de fazermos todo este processo de forma rápida e dentro das limitações da nossa mente.

Para começar, há que olhar para o modo como os horóscopos são escritos – são tipicamente uma descrição suficientemente vaga que inclui eventos e traços de personalidade aplicáveis ao comum dos mortais num ou noutro ponto da sua vida, referindo aspetos positivamente transformativos.

De forma interessante, o psicólogo Bertram Forer, em 1948, demonstrou precisamente, que este tipo de descrições é interpretado como sendo verdadeiro e único de quem as lê. A isso chamamos o “efeito de Barnum”.

Este efeito relaciona-se com um dos vieses cognitivos do qual a nossa mente é vítima – o viés da validação subjetiva.

Este viés leva a que uma afirmação (falsa ou verdadeira) seja vista como tão mais verídica quanto mais significado pessoal tiver e quanto mais positivamente for apresentada.

Até parece que a nossa mente criou este viés para facilitar a crença nos horóscopos (ou, aliás, os horóscopos é que tiram partido, de forma soberba, deste viés cognitivo).

Mas há, claro, outros processos mentais que conferem “veracidade” à leitura de um horóscopo, e que se aplicam na mesma medida às fake news ou ao populismo político que nos tem assolado. Um exemplo é a tendência para explicar o nosso comportamento como dependente de fatores externos – “Eu não fui sair porque estava a chover” – e o comportamento dos outros como traços de personalidade – “Ele não foi sair porque é preguiçoso”. Este viés de atribuição confere à astrologia ainda mais poder – que melhor fator externo do que o alinhamento dos astros para explicar os nossos comportamentos?

Outro aspeto explorado pelos astrólogos é o que chamamos “falácia/engodo do apelo à autoridade – a maior parte dos astrólogos são “professores” ou “mestres”. Este apelo à autoridade valida os horóscopos não pela veracidade dos mesmos, mas porque é uma autoridade que or propõe.

Assim se explica cientificamente o apelo da astrologia e dos seus horóscopos.

Claro está que me parece que a sociedade se deve defender destes esoterismos, assim como das fake news e dos populismos.

Isto passa por mais e melhor informação científica – por um verdadeiro investimento na literacia científica. ()

Jorge Almeida

Sem comentários:

Enviar um comentário