domingo, 29 de dezembro de 2024

Os fofos de Belas

 

Ao longo dos anos em que este blogue existe, evocámos aqui diversas preciosidades da doçaria tradicional portuguesa, para avivar memórias, despertar paladares e incentivar a degustação.

Foi o que se fez, a título de exemplo, com as trouxas da Malveira, com as fatias paridas e com o bolo-rei. E fazemos hoje com os fofos de Belas... 

Os fofos de Belas, inicialmente conhecidos como “Fartos de Creme”, são bolos de configuração cilíndrica, com uma textura semelhante ao pão-de-ló, sendo recheados com creme e polvilhados com açúcar.

São confecionados e vendidos na Fábrica dos Fofos de Belas (Rua Dr. Malheiros, 18, Belas), gerida durante muitos anos por Liberdade Fonseca, e atualmente pelos seus sucessores.

A autora da receita, que permanece há quatro gerações, foi a mãe de Liberdade Fonseca. A casa dos fofos de Belas produz estes bolos desde 1850.

Há alguns anos atrás, no n.º 6 da nossa revista ALDRABA (dezembro de 2008), a associada Vanda Oliveira (que sabe do que fala, pois reside em Belas), publicou uma crónica dedicada a estes bolos, onde informa que o estabelecimento dos fofos é um local agradável, pequeno, simples e acolhedor, com traços ainda do tempo em que era uma padaria que cozia e vendia pão saloio e marmelada.

Diz a Vanda sobre os fofos que “na primeira dentada, sente-se de imediato a sua textura fofa, quase que lembrando o pão-de-ló, mas bastante mais doce, com um creme macio, como recheio. E é esta junção do pão-de-ló com o creme, que surgiu da iniciativa da pasteleira/cozinheira, por volta de 1850 que faz deste um ícone gastronómico da zona de Sintra”.

Conta ainda a Vanda que “apesar de não terem atingido a projeção nacional de outros doces tradicionais, os fofos de Belas são um cartão de visita desta localidade. A melhor publicidade (e única) que têm é o “passa-palavra” dos clientes, que chegam de todo o lado propositadamente para comer e levar os fofos, que se vendem unitariamente e às caixas de 6”.

“E vendem-se muitos, segundo a empregada de balcão que falou um pouco sobre a história destes bolos. Antigamente, as muitas excursões que passavam por esta vila, constituíam a melhor clientela, proporcionando o conhecimento deste bolo nos seus locais de origem. Hoje em dia, as excursões já não passam por aqui, seguindo por vias mais recentes. Mas os clientes continuam a chegar de fora e a encher este pequeno espaço, principalmente ao fim de semana, desde pessoas anónimas a personalidades públicas. A população de Belas também é cliente, não só para consumo próprio, mas muitas vezes para oferta a familiares, amigos”.

JAF


quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

Almoço de Natal na coletividade "Os Combatentes"












52 presenças animaram, no passado domingo 15.12.2024, o almoço de confraternização do Grupo Dramático e Escolar "Os Combatentes", coletividade de cultura e recreio de Lisboa (Campo de Ourique) com quem a Aldraba tem tanta história em comum.

Depois do repasto, uma sonora e bem disposta atuação do Grupo de Violas e Cavaquinhos do Belém Clube, fruto da habitual solidariedade entre coletividades.

6 associados da Aldraba estavam entre os presentes no evento, renovando a expressão da nossa amizade com esta casa centenária.

JAF

  
 

domingo, 8 de dezembro de 2024

O 38.º Jantar-tertúlia e o convívio de Natal da Aldraba













Após a sessão de lançamento da revista n.º36 e no mesmo local (ver post anterior), 30 dos presentes participaram no jantar-tertúlia que, desta vez, foi também pensado como confraternização de Natal da associação Aldraba.

Antes da refeição propriamente dita, o CAJIL presenteou-nos com uns agradáveis momentos musicais de jazz pelo saxofonista Alexandre Simões.

O jantar foi animado e muito bem servido, tendo contribuído para a aproximação e o reforço dos laços de amizade nesta família alargada que é a Aldraba. No final, o sorteio de uns presentes, através da venda de rifas, para ajudar às finanças de uma associação que, conforme se relembrou, vive exclusivamente das quotizações e de donativos dos seus membros.

Em todo o evento, acompanhou-nos de forma sempre carinhosa o trabalhador do CAJIL Pedro Afonso (com duas colegas), que foi um dos esteios do sucesso deste dia.

JAF (fotos de JCoelho e ABrito)   

Como correu o lançamento da nossa revista n.º 36















 










33 participantes acompanharam com muito interesse a sessão de lançamento e apresentação do novo número da revista "ALDRABA", que decorreu entre as 18h e as 19.30h do passado 6.12.2024, no magnífico espaço do Clube Mercearia da Fundação de solidariedade social CAJIL, ao Lumiar.

A mesa da sessão foi composta pelo apresentador, Dr. Mário Máximo, pelo presidente do Conselho de Administração do CAJIL, Prof. José Augusto Felício, e pelo João Coelho, presidente da Assembleia Geral da Aldraba, que coordenou o evento.

O Prof. J.A.Felício ilustrou de modo muito expressivo os propósitos e a caminhada da Fundação, bem como do projeto Clube Mercearia.

O Dr. Mário Máximo, com grande maestria e enorme  abrangência cultural, apresentou de forma crítica o conteúdo da revista, prendendo a assistência e suscitando um rico e extenso diálogo com muitos dos presentes.

JAF (fotos de JCoelho e ABrito)

quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

Ainda acerca do nosso XLIV Encontro em Campo Maior







































Banner com gravuras do que foi o recente XLIV Encontro temático, composto pela nossa dirigente Marta Barata

sábado, 30 de novembro de 2024

38.º Jantar-tertúlia no Clube Mercearia do CAJIL (Lumiar), próx. 6.ªf, 6.12.2024, 20 h


















Vamos levar a efeito mais um jantar-tertúlia, que desta vez corresponderá também ao nosso habitual convívio de Natal. Irá ter lugar pelas 20 horas da próxima 6.ª feira, dia 6 de dezembro de 2024.

O local deste jantar vai ser o mesmo onde às 18 horas se realiza o lançamento da revista ALDRABA n.º 36 (ver post anterior), isto é, o Clube Mercearia da Fundação de solidariedade social CAJIL.

A antiga Mercearia Pedroso & Gameiro, fundada em 1868, na freguesia do Lumiar em Lisboa, deu lugar a um clube cultural com biblioteca e quatro espaços polivalentes, tendo sido totalmente restaurado e preservada a traça original desta tradicional mercearia portuguesa.

Fica situado na Rua do Lumiar, 62, mesmo em frente à sede do CAJIL (n.º 57), tudo isto muito próximo do final da Alameda das Linhas de Torres e da estação do Metro do Lumiar. Há estacionamento automóvel nas redondezas.

Seremos recebidos e acompanhados pelo nosso amigo Pedro Afonso, licenciado em animação sócio-cultural e responsável do Departamento de Cultura e Eventos da Fundação CAJIL.

A ementa do jantar incluirá entradas variadas, sopa, um prato principal à escolha (bacalhau com espinafres e broa ou carne de porco à alentejana), sobremesa (doce ou fruta) e bebidas, tudo ao preço único de 20 €.

Os interessados em participar devem inscrever-se, até 4.ª feira, dia 4 de dezembro, pelo mail da Aldraba (aldrabaassociacao@gmail.com), ou junto do João Coelho (T: 96 700 74 23, joaohcoelho@gmail.com) ou do José Alberto Franco (T: 96 370 84 81, jaffranco@gmail.com).

JAF

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Apresentação da revista ALDRABA n.º36 pelo escritor Mário Máximo no próximo dia 6dez2024












Vai ter lugar no próximo dia 6 de dezembro, 6.ª feira, a partir das 18 horas, o lançamento público do novo número da revista ALDRABA.

O evento terá lugar nas instalações da Fundação CAJIL (Centro de Apoio a Jovens e Idosos do Lumiar), sitas na Rua do Lumiar, 57, em Lisboa, muito próximo do final da Alameda das Linhas de Torres e da estação do Metro do Lumiar. O local exato será o chamado "Clube Mercearia", onde o CAJIL desenvolve as suas atividades.

Dá-nos a honra de apresentar a revista o escritor Mário Máximo, que é um ilustre intelectual e nosso amigo. Economista de formação, publicou já 25 livros, de poesia, romance, teatro, crónica, conto e ensaio (para além da participação em diversas antologias). No corrente ano, editou o romance “A Viagem Para a Literatura ou o Destino de Ferreira de Castro”.

Mário Máximo tem desenvolvido intenso trabalho na área da cidadania de língua portuguesa e da lusofonia. Foi ainda vereador e vice-presidente da Câmara Municipal de Odivelas, bem como Presidente do Centro Cultural Malaposta, e Presidente da Direção da Associação Fernando Pessoa.

Todos os associados e amigos da Aldraba são convidados a assistir e a participar nesta sessão, e a trazerem outros amigos convosco.

JAF 


quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Ecos do Encontro temático em Campo Maior


 









































































































































































































O 44.º Encontro temático da Aldraba, subordinado ao lema "O café e o património histórico", reuniu 18 associados e amigos em Campo Maior, num fim de semana de meteorologia muito fria mas bastante caloroso na partilha e na fruição cultural.

Durante os dias 16 e 17 de novembro de 2024, visitámos demoradamente o magnífico Centro da Ciência do Café (onde muito se aprendeu sobre a história da bebida mais consumida em todo o mundo e sobre o trabalho de décadas desenvolvido a partir de Campo Maior), estivemos depois na Casa das Flores (que evoca as importantes festas populares que de tempos a tempos o povo da vila promove), passámos pelo Lagar-Museu Visconde d'Olivã (com a minuciosa representação das atividades do azeite), percorremos e apreciámos o Castelo e sua fortificação abaluartada de tão rica história, fizemos um contacto breve com a Capela dos Ossos, e terminámos com uma incursão na aldeia de Ouguela, notável pela sua fortaleza, a respetiva cisterna, e uma imaginativa destilaria de gin instalada na antiga escola primária!

Um Encontro que deixou uma marca muito forte em todos os participantes, e cuja impecável preparação se deveu aos nossos companheiros Nuno Silveira e Margarida Vicente, a quem exprimimos a maior gratidão.

JAF (fotos de ABrito, LPereira e MVicente, com exceção da foto de grupo - tirada por Julio García, do CCCafé) 


segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Pelo sonho é que vamos



Pelo sonho é que vamos

Pelo sonho é que vamos,
comovidos e mudos.

Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.

Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia a dia.

Chegamos? Não chegamos?
Partimos. Vamos. Somos.

Sebastião da Gama


(Reproduzido no verso da contracapa da revista ALDRABA n.º 36)


sexta-feira, 15 de novembro de 2024

Está no prelo o n.º36 da revista ALDRABA


 










Está a ser impresso na gráfica o novo número da nossa revista semestral.

Contamos poder começar brevemente a sua distribuição aos associados, e está já programada uma sessão de apresentação pública na tarde do próximo dia 7 de dezembro de 2024 (sábado) - em local e hora a anunciar.

Antecipamos já o conteúdo do n.º 36 da revista, em que assumem especial destaque os centenários de dois grandes nomes da nossa história e da nossa cultura (Damião de Góis e Luís de Camões), bem como os 100 anos de dois portugueses notáveis do séc. XX (Sebastião da Gama e Irisalva Moita):


Sumário

EDITORIAL

O que vejo da minha janela

Albano Ginja

OPINIÃO

Damião de Góis (1502-1574), um homem do Renascimento

Luís Figueiredo                                                           

Luís de Camões – Vate imortal

João Coelho                                                                

A tampa de sarcófago do “putto” de Elvas

J. Fernando Reis Oliveira                                            

LUGARES DO PATRIMÓNIO

Nomes de localidades em azulejos

José Alberto Franco                                                     

RITUAIS, TRADIÇÕES E REALIDADE

Chás, mezinhas e benzeduras

Ana Isabel Veiga e Luís Filipe Maçarico                         

DESABAFOS

O 25 de abril

Laurinda Figueiras                                                       

O vazio da cultura popular

Adriano Pacheco                                                         

VULTOS A ADMIRAR

No centenário do nascimento de Sebastião da Gama

Nuno Roque da Silveira                                               

Recordando Irisalva Moita

Nuno Roque da Silveira                                                

CRÍTICA DE LIVROS

Coletividades e resistência                                        

José Alberto Franco

ALDRABA EM MOVIMENTO

Maio a outubro de 2024         

José Alberto Franco


terça-feira, 5 de novembro de 2024

XLIV Encontro temático da ALDRABA: “O café e o património histórico”, Campo Maior, 16 e 17 de novembro de 2024




No próximo fim-de-semana de 16/17 de novembro de 2024, a Aldraba vai levar a efeito o seu 44.º encontro temático, desta vez na vila histórica de Campo Maior, do distrito de Portalegre e sub-região do Alto Alentejo.

Campo Maior tem um passado histórico riquíssimo, mas notabiliza-se atualmente pela produção e comércio de café e, de 4 em 4 anos, pelas Festas da Flor.

A nossa atividade terá o seguinte programa: 

Sábado, 16.11

11 h - Visita ao Centro de Ciência do Café (DELTA) (Concentração do grupo no parque de estacionamento do CCC/DELTA, a partir das 10h30)

13 h - Almoço no Restaurante Ministro (serviço à lista)

15 h - Visita ao Lagar-Museu Visconde d'Olivã

15h30 - Visita ao Museu Aberto - Casa das Flores

Seguir-se-á deslocação para os alojamentos* em Elvas

Jantar livre em Elvas 

Domingo, 17.11

10h15 - Visita ao Castelo e Fortificação Abaluartada de Campo Maior 

11h45 - Visita à Igreja Matriz e Capela dos Ossos

13 h - Almoço no Restaurante Ministro (serviço à lista)

Após o almoço

Visita à Aldeia Histórica de Ouguela - castelo, muralha, cisterna e casa do governador.

Visita à destilaria de gin na antiga escola primária.


* Os alojamentos devem ser contratados diretamente pelos participantes em Elvas, sugerindo-se o Hotel Brasa (T: 268 621 070/1) ou o Hostel Luso-Espanhola (T: 268 08 45 75 ou 96 342 40 23).

Os amigos e associados da Aldraba que queiram participar neste Encontro devem inscrever-se por mensagem para aldraba@gmail.com, ou por telefonema para o Nuno Silveira (T: 96 291 60 05), o mais tardar, até à 5.ª feira, 14 de novembro de 2024. 

JAF



sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Memórias da escola primária



Um texto delicioso da nossa amiga Natércia Duarte, de Castro Verde, que reproduzimos com a devida vénia de um post publicado há poucos dias na sua página do facebook. Memórias da infância algarvia desta amiga! 


Uma tarde fui com a mãe à loja do Anastácio comprar um corte de sarja, um carrinho de linhas e alguns botões. Tudo imaculadamente branco, como era obrigatório!
Depois fomos as duas a casa da costureira, a nossa vizinha da rua de trás, a Tainha. Ela e a minha mãe estiveram tempo sem fim a discutir o feitio mais na moda - se aberta à frente, se aberta atrás, com peitilho, sem peitilho, com pregas, com machos… mas para mim nada daquilo interessava.

A minha única reivindicação era que tivesse duas algibeiras, de preferência grandes, coisa que a mãe não queria, pois, dizia ela, só serviam para eu colocar lá as mais variadas porcarias e andarem sempre sujas. Mas, se não tivesse algibeiras, onde poria eu as lagartixas e os gafanhotos que haveria de apanhar no muro de pedras que havia a caminho da escola?

Ao fim de uns dias, depois de duas provas, ali estava ela, a minha primeira bata, com duas algibeiras onde caberiam os mais variados segredos, à espera da grande estreia na escola primária.
No dia 7 de Outubro, lá estava eu com o cabelo penteado a preceito, soquetes brancas rendadas, livros na pasta, a minha mão na mão da mãe, à espera de um mundo novo que se abriria ao entrar na escola.

A escola do Bairro ficava muito perto da minha casa. Duas ruas e menos de cinco minutos depois já se avistavam as casas do bairro municipal de Loulé, que emprestava o nome à escola. Lá dentro só meninas, todas de bata branca, muitas com um ar contente, como eu, e outras a chorar agarradas às saias das mães, que não queriam deixar como se elas fossem as boias de salvação num naufrágio iminente.

Entrei na sala e sentei-me muito direita na carteira que me foi indicada. A mãe tinha tido a esperança de que eu fosse diretamente para a 2ª classe pois já sabia ler e escrever e fazer contas mas, apesar do pedido, não conseguiu que a escola concordasse.
Eu não tinha considerado isso um problema até ao momento em que a professora deu as primeiras lições - as vogais - e mandou que todas nós preenchêssemos linhas e mais linhas de um caderno com aquelas letras. Despachei aquilo num instante para ver se havia mais coisas para aprender, mas a seguir veio o 1 e o 2 e mais linhas e linhas de uns e dois e três e de vogais e ditongos...
Para mim, que queria aprender coisas novas, que já lia livros da biblioteca, aquilo era uma verdadeira perda de tempo.

Um dia, à tarde, quando tocou a sineta, arrumei as minhas coisas e assim que cruzei o portão, informei a mãe da minha decisão:
- Mãe, já não quero vir para esta escola!

E à pergunta apreensiva da minha mãe “então filha?” respondi tudo o que me ia na alma: que eu já sabia ler e escrever, que tinha passado os últimos dias naquele trabalho horrível de alinhar “a,e,i,o,u” num caderno de duas linhas e que a professora não me tinha ensinado nada que eu não soubesse. E rematei com o mais importante, que só queria ir à escola quando fosse para aprender coisas novas.

Depois de me ouvir, a mãe explicou-me o inexplicável: que eu tinha de ir à escola, que não podia faltar mesmo que não fosse aprender nada de novo e que tinha de esperar que as outras meninas aprendessem o que eu já sabia para depois a professora ensinar novas matérias.

Ainda insisti, tentando mostrar como aquilo era disparatado. Mas a mãe respondia que não, que apesar de saber como eu estava aborrecida, não era assim que as coisas se tratavam…

“Se fossemos ricos e influentes, a escola teria agido de maneira diferente. Tinham-na matriculado no ano a seguir”, desabafava em surdina a minha mãe, contando o sucedido às vizinhas e dando exemplos de algumas histórias parecidas que tinham terminado com um final mais feliz.
Andei uns dias muito aborrecida, sem vontade nenhuma de ir à escola. Mas ao fim de algum tempo, os recreios começaram a compensar as tristezas. Assim que tocava a sineta, puxada por uma corda pela senhora Zezinha, a única contínua da escola, saíamos todas em fila e em silêncio para depois atirar ao vento aquela liberdade contada em minutos e aproveitá-la para ir brincar aos potes, às casinhas, à rolha, aos reis e às rainhas, à calha, às cinco pedrinhas, à “maneca”, como chamávamos ao jogo da macaca… ou para dançar danças de roda como a borboleta branca ou a triste viuvinha…
E para além do recreio, mesmo ao lado da escola, também havia um outro mundo novo por aprender:
O bairro com as suas casas todas iguais, encostadas umas às outras, com quintais de muros baixos e amoreiras onde me empoleirava para apanhar folhas para os bichos-da-seda;
O cerro da Cabecinha do Mestre, que tinha uma única casinha no alto da subida e onde o musgo para o presépio nascia nos valados, nas pedras e no chão e donde vínhamos com a alma mais verde e com as unhas pintadas de terra escura;
A olaria do vizinho João e o seu exército de chaminés rendilhadas, vasos, infusas e cântaros, que nasciam da melodia do chiar da roda, da dança rodopiante dos seus pés e do aconchego das suas mãos hábeis;
O largo da feira, o sítio onde acampavam famílias ciganas que influenciavam, com a sua chegada, os locais de brincadeira dentro do recreio. Nos dias em que tínhamos aqueles vizinhos, nenhuma menina se aproximava do muro daquele lado e partilhavam histórias e medos entre elas. Só eu ficava empoleirada, olhando para eles, sem achar que pudesse vir dali qualquer sinal de perigo, imaginando como seria bom viver assim, uns dias aqui, outros ali, brincando na terra, correndo ao sol com os cães, estendendo cordas de roupa como bandeiras ao vento, esquecendo o frio da noite com labaredas e música e cumprimentando o luar antes de adormecer. Em noites de sonhar ser livre como os ciganos, adormecia contando as estrelas para lá do teto do meu quarto.

Andar na escola, afinal, valia mesmo a pena!

Natércia Duarte

quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Foi lançado o caderno temático "Cataventos do Concelho de Moura"









A biblioteca da Casa do Alentejo em Lisboa acolheu no passado dia 29/10/2024 o lançamento e a 1.ª apresentação pública do caderno temático da Aldraba "Cataventos do Concelho de Moura".

O ex-presidente da Câmara Municipal de Moura e atual diretor do Panteão Nacional, Santiago Macias, brindou os presentes com uma inspirada apresentação do tema, acompanhada de notas pessoais sobre a importância destes objetos na identidade das populações, e da relevância dos trabalhos de investigação como este na preservação das memórias.

Os dois co-autores, os nossos companheiros Luís Maçarico e Ana Isabel Veiga, expuseram depois o percurso, as dificuldades encontradas e a forma como as superaram, na execução deste seu trabalho.

A assistência interagiu de forma muito rica com a mesa.

Irão seguir-se novas apresentações deste caderno temático na cidade de Moura e nas vilas de Cuba e de Idanha-a-Nova, cuja marcação está a ser tratada com amigos dessas localidades. 

JAF (texto e fotos)

 

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

O "peixe-diabo-negro" descoberto nas costas da ilha da Madeira




A ALDRABA está atenta ao património natural do nosso país, e às notícias que lhe dizem respeito. Assim, pela curiosidade que contém este episódio da nossa história natural, reproduzimos uma reportagem publicada no "Diário de Notícias" sobre a descoberta na Madeira, em 1885, de um peixe com aspeto causador de terror, que ficou designado por "Melanocetus johnsonii", em honra do cientista inglês que o descobriu, James Yate Johnson: 

Dos mares da Madeira emergiu no séc. XIX um “diabo” aquático

Costa norte da ilha da Madeira, freguesia de São Vicente, ano de 1885. Um intrépido naturalista inglês desce ao cerne da terra. Os habitantes do lugar informaram o cientista da existência da boca de uma gruta rasgada na rocha de origem vulcânica. A placidez do lugar, um vale viçoso a correr em direção ao Atlântico, engana o tumulto da sua história pretérita. Há 890 mil anos, uma erupção vulcânica ocorrida a sul, nas alturas do Paul da Serra, lançou torrentes de lava rumo ao litoral. Do cataclismo nasceria uma rede de túneis. James Yate Johnson, nascido em 1920, então com 65 anos, não hesitou perante o negrume das mais tarde batizadas Grutas de São Vicente. Entrou na bocarra de origem vulcânica e assumiu a descoberta oficial do lugar. Johnson apaixonara-se pela Madeira muitos anos antes, em 1851.

Nas décadas seguintes, o britânico percorreria milhares de quilómetros nos caminhos madeirenses. Também singrou no mar. O clima suave do território contrastava com a aspereza da Kendal natal de Johnson, localidade do noroeste de Inglaterra. Peixes, ouriços-do-mar, crustáceos, esponjas, aranhas terrestres, flores e musgos, tudo serviu o interesse e a curiosidade científica de James Yate. Um afã que levou o naturalista a recolher espécimes para catalogação própria, mas também a pedido de colegas naturalistas como George Busk, paleontólogo e botânico britânico de origem russa.

Seria do mar, a 24 de dezembro de 1863, que James Yate Johnson colheu a criatura que alimentou a matéria para inúmeros manuais de zoologia nos anos seguintes. Já nas mãos do responsável de zoologia do Museu de História Natural de Londres, o zoólogo Albert Günther, o ente marinho com pouco mais de dez centímetros de comprimento e a pesar cerca de oito gramas, mereceu a primeira descrição da sua morfologia, sintetizada nos seguintes termos: “Este peixe singular distingue-se pela desproporção das várias partes do corpo (...), a cabeça, de forma tetraédrica, é a parte mais extensa de todo o animal. A boca é enorme (...) A extensibilidade lateral da boca não é menor do que a vertical; de modo que a presa que aí é recebida pode exceder o tamanho do próprio peixe”.

As palavras vertem da obra de 1885, The Annals and magazine of natural history; zoology, botany, and geology (vol. 15). O animal em questão seria classificado pela ciência como Melanocetus johnsonii, em honra do cientista que o descobriu. À vista, a criatura parece-nos saída de um conto de terror lovecraftiano. O também denominado Peixe-Diabo Negro, é um ser abissal, habita profundidades até ao 1,5 Km, na zona batipelágica, onde a temperatura média ronda os 4°C e a pressão atinge os 400 Kg por cm2. A vida do Melanocetus johnsonii decorre em regiões afastadas do olhar humano. O pequeno peixe com um comprimento máximo de 18 cm, disseminado em todos os oceanos, atrai as presas com um falso isco luminoso bolboso que lhe eclode do focinho. As fêmeas apresentam olhos subcutâneos, enevoados, e exibem um espinho curto na barbatana dorsal. A pele e os dentes excretam um dos venenos mais letais para as criaturas marinhas. A toxina botulínica causa paralisia muscular, eventual paralisia do sistema respiratório, a anteceder a morte.

Entre os inúmeros mistérios a envolver a existência do Melanocetus johnsonii, um deteve a atenção de ictiólogos ao longo de décadas. Nenhum macho deste peixe das profundidades fora capturado. Em 1924, o britânico Charles Tate Regan percebeu a existência de um pequeno peixe que parasitava um exemplar da criatura descoberta cerca de 60 anos antes por James Yate Johnson. Regan percebeu tratar-se de um macho de Melanocetus johnsonii em processo de reprodução. Esta espécie conta com um dos mais notáveis exemplos de dimorfismo sexual, com a ocorrência de indivíduos do sexo masculino e feminino de uma espécie com características físicas não sexuais marcadamente diferentes. O macho do Peixe-Diabo Negro não mede mais de 3 cm e depende da fêmea para se alimentar.

Em 2014, a comunidade científica saudou as filmagens que chegavam das profundidades do mar ao largo do estado da Califórnia, nos Estados Unidos. Um espécime de Melanocetus johnsonii fora filmado, pela primeira vez, no seu habitat. O submersível Doc Ricketts, operado pelo Monterey Bay Aquarium Research Institute, captava num filme de poucos segundos o carácter extraordinário do peixe.

James Yate Johnson morreu na cidade do Funchal no ano de 1900. Permaneceu no arquipélago atlântico perto de cinco décadas, sem esconder a afeição pelo território. Em 1860, escreveu o guia para viajantes Madeira, its climate and scenery, um detalhado manual para conhecimento das ilhas. Geografia física, conselhos médicos, história, gentes, monumentos, paisagem e jardinagem, clima, zoologia, entre inúmeros temas, perpassam as páginas do livro. Não faltam curiosidades. Nos idos da década de 1860, a viagem entre o Funchal e a Calheta era périplo para oito horas e amiúdes paragens para descanso dos viajantes.

Jorge Andrade, DN, 21/10/2024

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Caderno temático "Cataventos do Concelho de Moura" lançado na Casa do Alentejo na 3ªf, dia 29/10/2024, às 18h


 










É com a maior satisfação que anunciamos para o próximo dia 29 de outubro de 2024, 3.ª feira, pelas 18 horas, o lançamento público do caderno temático n.º 2, que a nossa associação acaba de editar, com o título "Cataventos do Concelho de Moura".

Assim se concretiza um objetivo fixado no nosso Plano de Atividades para o corrente ano de 2024, e por cuja materialização nos vínhamos batendo há bastante tempo.

Este caderno temático consiste numa publicação etnográfica de 75 páginas, profusamente ilustrada (com 30 páginas de fotografias a cores), da autoria dos antropólogos Ana Isabel Veiga e Luís Filipe Maçarico, e prefaciada pelo também antropólogo Eddy Chambino.

A apresentação estará a cargo do historiador Santiago Macias, antigo Presidente da Câmara Municipal de Moura, arqueólogo no Campo Arqueológico de Mértola e atual Diretor do Panteão Nacional.

A sessão de lançamento terá lugar na biblioteca da Casa do Alentejo, na Rua das Portas de Santo Antão, 58, em Lisboa.

Apela-se à comparência e participação de todos os associados e amigos, e à vossa colaboração na divulgação do evento.

JAF

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Nomes de localidades em azulejos (cont.43)







Desta vez, a Aldraba foi desencantar uma nova placa toponímica do Automóvel Club de Portugal na povoação vinícola de Runa.

Runa é uma localidade da atual União de Freguesias de Dois Portos e Runa, no concelho de Torres Vedras, do distrito de Lisboa e da atual sub-região do Oeste.

Com a divulgação desta placa, passamos a averbar um total de 176 placas toponímicas publicitadas, situadas em 83 concelhos do país e na totalidade dos 18 distritos do continente.

Mantem-se o total de 158 localidades diferentes aqui representadas, pois já havíamos publicitado uma primeira placa de Runa, em 17.8.2011 - aliás, em muito melhor estado de conservação do que a de hoje...

JAF



sábado, 12 de outubro de 2024

As trouxas da Malveira



Segundo a Wikipédia, “as trouxas da Malveira são um tipo de bolo, de origem conventual, que consistem em tortas ou travesseiros, de pequenas dimensões, recheadas com um creme de baunilha e frutos secos.  É uma prestigiada e antiga iguaria doce da região de Mafra, com uma grande aceitação por parte de toda a população, representando assim um testemunho etnográfico da cultura saloia local”.

“… A confeção destes bolos consiste, inicialmente, na preparação de uma massa de torta, que se assemelha a um pão de ló, com ovos, farinha, açúcar e fermento. Posteriormente, corta-se a massa em pequenos retângulos que se recheiam com um creme abaunilhado, feito a partir de leite, ovos, baunilhafrutos secos (amêndoas torradas), entre outros ingredientes”.

“… As trouxas da Malveira derivam de uma receita conventual, originária do Convento de Odivelas, inicialmente denominadas de “tortinhas de amêndoa”. Foram levadas até á Malveira pela D. Emília Sousa Antunes, que trabalhava para as freiras do convento, juntamente com D. Teresa, amiga de D. Emília e doceira do convento. D. Emília fundou e estabeleceu, na vila da Malveira, terra onde nasceu, a Fábrica das Trouxas da Malveira, em 1906”.

“… A denominação destas pequenas tortas recheadas com um creme abaunilhado, surge da admiração de D. Emília pela sua mãe, que trabalhava como lavadeira para as senhoras de Lisboa, pois estes bolos fazem lembrar as trouxas de roupa levadas na cabeça das lavadeiras”.

Reproduzimos agora um folheto promocional da Fábrica das Trouxas:

“Maria Celeste Esteves França da Costa conta: ‘A minha tia-avó, Emília Sousa Antunes, fundou a Fábrica das Trouxas da Malveira em 1906. Começou por fazer pastéis de grão, mas porque a sua mãe era lavadeira, lembrou-se de fazer um doce com a forma de uma trouxa de roupa’”.

“Em 1922, Maria Emília Antunes Lopes Esteves, sobrinha de Emília Sousa Antunes, é a nova diretora da Fábrica. A marca é registada em 1945. Nessa época, o Carnaval de Torres Vedras trazia verdadeiras multidões à Fábrica da Malveira. Quatro pasteleiros iniciavam o processo de bater a massa logo de madrugada, para que pudesse ser retirado do forno um tabuleiro de trouxas de três em três minutos”.

JAF