quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Lançamento do nº16 da ALDRABA no próximo sábado

Como vínhamos anunciando, é no próximo sábado, 29.11.2014, que terá lugar o lançamento público do nº 16 da revista ALDRABA.

A sessão vai ter lugar na sede da Associação das Coletividades do Concelho de Lisboa, a partir das 18 horas. A ACCL fica na Rua Saraiva de Carvalho, 8/2º Esqº, junto à Igreja de Sta. Isabel. A apresentação da revista será feita pelo antropólogo Augusto Flor, presidente da Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto.

Todos os associados e amigos da Aldraba são convidados a comparecer de forma interessada e crítica. Os que puderem, são também desafiados a participar num jantar de confraternização em restaurante das redondezas.

JAF



quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Salvé o dia 20.11.2004!

Em 20 de novembro de 2004, um punhado de cidadãos e cidadãs reuniu-se em Montemor-o-Novo para começar a dar corpo ao projeto cívico e cultural, generoso e inovador, de que nasceu a Associação ALDRABA.

No dia em que se perfazem exatamente 10 anos sobre esse impulso fundador, não podemos deixar de o assinalar aqui, e de recordar com afeto os companheiros e amigos presentes.

Bem hajam, e longa vida à ALDRABA!

JAF

sábado, 15 de novembro de 2014

Toponímia de Lisboa, essa nossa familiar















Pré-publicação do artigo do nosso amigo Appio Sottomayor, que vai sair no nº 16 da revista ALDRABA, cuja apresentação pública terá lugar no próximo dia 29 de novembro:

Comecemos por uma verdade que La Palisse não desdenharia: todos os dias lidamos com a toponímia, sem nos preocuparmos muito com o seu conteúdo e o seu significado. Na verdade, a situação mais vulgar é que cada um de nós viva numa casa que ostenta um número dito “de polícia” e se situa num arruamento com um determinado nome. No entanto, sejamos francos, não serão muitas as vezes em que paramos para pensar sobre as razões pelas quais aquela rua se chama assim e a outra aonde nos dirigimos tem outra designação. E afinal, sobretudo quem habite numa grande cidade viverá rodeado de indicações toponímicas.

Sendo pois uma realidade que nos cerca, não é fácil, contudo, caracterizá-la através de uma concepção rígida de origens. Modernamente, a prática mais habitual é consagrar nas ruas nomes de pessoas, em jeito de homenagem. Mas os critérios têm sido os mais variados, ao longo dos tempos. Não é possível também fixar uma época, apontando-a como sendo a dos primórdios da toponímia. Desde a mais remota antiguidade, o ser humano terá tido necessidade de se referir a determinados locais e de os qualificar, para deles poder dar testemunho a outras pessoas e para se orientar.

Reportemo-nos a Lisboa. Uma das primeiras tendências terá sido a de fixar nomes através de quaisquer características geográficas. E o certo é que muitas dessas designações primitivas acabaram por se perpetuar. Por exemplo: continuamos a chamar “Lapa” a um bairro que foi assim baptizado por causa de uma enorme pedra que dominava os terrenos em roda.

Como falamos da Penha ou da Achada, sem cuidar muito de pensar que nos referimos a uma elevação ou a uma pequena planície a meia encosta... Ou como, lembrando cursos de água ou nascentes, continuamos a usar topónimos como Águas Boas, Rego, Ribeira, Arroios, Rio Seco, Sete Rios, Poço do Chão, Poço do Bispo, Poço da Cidade...
Também a existência predominante de certo tipo de plantas ou de culturas serviu longamente para identificar lugares. Onde predominava a giesta nasceu o Giestal, onde havia um campo de juncos a Junqueira... Os olivais e oliveiras cobriam boa parte do que é hoje a cidade, pelo que os seus nomes aparecem na populosa freguesia na parte oriental da cidade, mas também nos Prazeres, na Graça, em Carnide, ou até num larguinho que fica a meio da Calçada da Glória. Mesmo os terrenos onde a vegetação não seria muito abundante deram azo a topónimos, como a Charneca ou a Horta Seca.

Até a existência de certas particularidades do terreno podia servir de causa de topónimos – as Pedras Negras, as Furnas, a Boa Vista, a Bela Vista... O mesmo se diga da existência de um mineral – o Salitre... Ou de locais de trabalho que iam aparecendo e dando brado – os Moinhos, o Forno, os Lagares, as Olarias...

O facto de algumas personalidades consideradas de maior destaque irem residir em determinado local foi também causa do aparecimento de alguns topónimos, sem que fosse então necessário especificar a quem se referiam. Temos, por exemplo, a Calçada do Duque, a Rua do Prior ou a Rua do Cura. No primeiro caso, foi relativamente fácil concluir que se tratava do Duque de Cadaval, cujo palácio ficava junto do Rossio e cujas terras se estendiam pela encosta. Mas, quanto ao cura e ao prior, seriam por certo eclesiásticos muito importantes em certa época – tanto que nem houve necessidade de se dizer de quem se tratava.

A existência de múltiplas igrejas, capelas e conventos serviu também de óbvia razão para criar topónimos. Hoje, para explicar muitos deles, tem de se recorrer à História. Só assim se perceberá porque há uma rua de S. Pedro ou um largo de S. Rafael em Alfama: lembram ambos antigas igrejas que entretanto desapareceram. O mesmo se diga dos Brunos, dos Barbadinhos, das Francesinhas, das Trinas e de mais alguns, que lembram antigos conventos que existiam naqueles locais.

ATÉ AS ALCUNHAS E OS CONSTRUTORES

A imaginação ou o sentido prático não tinham limites apertados. Daí que até algumas alcunhas ou mesmo defeitos físicos de moradores em certo arruamento acabarem por lhe dar o nome. Assim, existiu há muito na Ajuda uma loja de ferro-velho. O povo chamava-lhe o ferrugento. Como o proprietário morresse e ficasse a viúva a gerir, a Ferrugenta ganhou foros de personalidade e ainda hoje lá existem a travessa e o beco da Ferrugenta. Quanto a defeitos físicos, lembremos apenas o Pé de Ferro ou o Braço de Prata, casos em que as próteses usadas deram origem a topónimos.

Em tempos da reconstrução de Lisboa após o terramoto, surgiu também a consagração de algumas actividades e profissões em ruas da cidade, geralmente naquelas onde eles se agrupavam. O hábito ficou e chegou até à Primeira República. O próprio Marquês de Pombal fez o seu agradecimento aos comerciantes, chamando Praça do Comércio ao velho Terreiro do Paço. Mas lá foram surgindo, nas esquinas das ruas, placas que consagravam os Sapateiros, os Fanqueiros, os Douradores, os Bacalhoeiros, os Correeiros...

Não deixa de ser curiosa e digna de realce uma forma de toponímia com que talvez quase ninguém contasse – a não ser os próprios interessados. Foi o caso de alguns construtores civis que, tendo edificado bairros maiores ou menores, fizeram questão de ficar perpetuados nas ruas onde tinham trabalhado. E conseguiram. O mais conhecido será o Senhor Andrade.

Encarregou-se ele de dirigir a construção de boa parte do bairro dos Anjos. E não hesitou em dar a algumas ruas os nomes de familiares e o dele próprio. Temos assim a Rua Andrade, a Rua Maria Andrade, a Rua Palmira... Outro, o senhor Lopes, que andou azafamado na zona do Alto de S. João, lá tem a sua Rua Lopes e o pequeno Bairro Lopes. Também o senhor Santos, construtor de prédios no Rego, teve a habilidade de fazer com que se passasse a chamar ao local o Bairro Santos – o que, diga-se num parêntese, dá por vezes lugar a confusões, já que alguns lhe chamam “bairro de Santos”, o que poderá levar a pensar na Madragoa...

O PODER MARCA POSIÇÃO

No entanto, este uso, essencialmente popular e espontâneo, de dar nomes às ruas de Lisboa começou a sofrer alterações logo após o terramoto de 1755. A autoridade decidiu intervir na toponímia e, embora mantendo e respeitando muitas designações tradicionais, não se dispensou de publicar um decreto em 5 de Novembro de 1760, que veio dar nome a 14 ruas da Baixa, recém-reconstruída.

Parece que o Poder tomou o gosto à prática de regular os nomes das artérias da cidade. A seguir ao referido decreto, não se registaram alterações notáveis. Mas logo no início do século XIX apareceram as primeiras normas, tentando regularizar nomes e locais, sobretudo para uso dos ainda incipientes Correios. Em 1836, o Governo Civil de Lisboa publicou diplomas sobre a atribuição de topónimos, que lhe ficava reservada. Em 1859, o mesmo Governo Civil reafirmou a sua autoridade na matéria, dando-se como única entidade competente para dar nomes às ruas ou modificá-los.

Com a entrada em vigor do Código Administrativo, em 1878, as coisas mudaram. A competência da atribuição de topónimos passou a ser da Câmara Municipal, prática que se mantém até hoje. Tal não impede que, às vezes (raras, diga-se) sejam outras entidades a “baptizar” as ruas, sem darem prévio conhecimento à edilidade. O exemplo mais evidente será o da Expo-98, durante a qual se deram nomes a arruamentos onde se registaram desde duplicações (caso de Fernando Pessoa) até designações um tanto insólitas (Sandokan e outros).

MUDANÇAS

A prática de dar às ruas nomes de pessoas generalizou-se entretanto, sobretudo desde a I República. As razões são fáceis de perceber: tudo quanto evocasse ou fizesse lembrar a Monarquia seria prontamente substituído. E, por arrastamento, as designações de carácter religioso seguiriam o mesmo caminho. A Rua do Príncipe passou a Primeiro de Dezembro, a Avenida D. Amélia foi crismada de Almirante Reis, a Ressano Garcia mudou para República – e por aí fora. Da mesma forma, S. José dava lugar ao jornalista Alves Correia, S. Lázaro ficou a chamar-se 20 de Abril – tudo mudado.

Veio o Estado Novo e algumas designações tradicionais voltaram aos seus antigos lugares, sem que, em boa verdade, se registassem grandes apagamentos, já que os nomes substituídos, na maior parte dos casos, se limitaram a mudar de sítio. O Rato, por exemplo, voltou às placas, acabando a Praça do Brasil, já que este país passou a ter avenida. O Presidente Wilson mudou de bairro e a avenida onde estava voltou a chamar-se de D. Carlos.

Chegado o 25 de Abril, não se registaram mudanças de topo. Obviamente, a Avenida 28 de Maio mudou de nome e passou a ser das Forças Armadas. E pouco mais! Foi maior a preocupação de apor nomes a ruas novas.

Chegamos à actualidade. Surgiram, durante alguns anos, muitas ruas novas. Mas não as suficientes para a verdadeira febre que muitas vezes se apossa de muitos cidadãos. Na Comissão Municipal de Toponímia, foi utilizada a expressão “síndrome de funeral”, para caracterizar alguma prática que é seguida: morre determinada pessoa e os seus familiares ou amigos logo pensam em homenageá-lo através da atribuição do seu nome a uma rua.

Fervilham por isso na Comissão, na Assembleia Municipal e na Câmara catadupas de nomes propostos para passarem a figurar nas esquinas. Ora não há ruas que cheguem! Parece que terá de haver novas formas de homenagem.

A Comissão acima referida foi criada em 1942 como órgão consultivo, pronunciando-se sobre a criação ou alteração de topónimos. A sua composição tem sofrido alterações ao longo dos tempos e ainda recentemente foi alvo de nova remodelação. Entretanto, foram aprovadas normas que constituem como que um regulamento. Na sua essência, trata-se de consagrar princípios que a Comissão há muito vinha defendendo. É o caso, por exemplo, da não concordar com mudanças de topónimos. Na verdade, a toponímia poder considerada como uma espécie de compêndio de História – e nesta não devem ser riscados capítulos. E, para além deste argumento de ordem histórica, acresce um motivo mais material: quando muda o nome de uma rua, os respectivos moradores têm de, à sua custa, alterar a sua documentação!

Outra norma que já vinha sendo seguida e agora ficou consagrada foi a da necessidade de deixar passar um prazo razoável entre a morte de alguém e a atribuição do topónimo.

É preciso que, passados anos, a figura destacada continue a ser lembrada e a serem reconhecidos os seus feitos. Acabar-se-á assim com o tal “síndrome de funeral” atrás referido.

Com todos estes cuidados, vai sendo possível manter algumas relíquias nos letreiros da cidade, para que verifiquem os actuais cidadãos e os vindouros a extraordinária imaginação de quem deu nomes às nossas artérias. A começar pelos designativos. Poucas cidades poderão gabar-se de ter avenidas, ruas, travessas, azinhagas, becos, alamedas, boqueirões, calçadas, calçadinhas, campos, escadinhas, jardins, largos, pátios, praças, regueirões, telheiros, vilas – e não se pretende aqui esgotar o tema. Mas, achando pouco, Lisboa ainda arranjou forma de criar uns tantos sítios que não têm designativo nenhum: as Escolas Gerais (há rua e há sítio), o Poço do Borratém, a Costa do Castelo, o Caracol da Graça, a Triste Feia... “Ruas que o não são” – lhes chamei, em publicação que a Câmara editou.

A toponímia lisboeta dá, de facto, para tudo. Até para consagrar virtudes (Fé, Esperança, Caridade...), lembrar as flores (o Jasmim, as Violetas, a Rosa, os Cravos...) e arranjar uma fórmula poética e química para dar nome a uma travessa: a Água de Flor!

APPIO SOTTOMAYOR

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

A propósito do cante alentejano

Pré-publicação do artigo “PATRIMÓNIO CULTURAL IMATERIAL: CONCEITOS E FORMAS DESADEQUADAS DE OLHAR A PAISAGEM…”, do nosso amigo Paulo Lima (diretor da Casa do Cante de Serpa), inserido no nº 16 da revista ALDRABA, atualmente no prelo:

Academizar, institucionalizar, a nada leva.
É necessário estar com as comunidades

No dia em que escrevo estas palavras saiu um artigo no jornal Público sobre património cultural imaterial (vulgo PCI), as direções regionais de cultura, inventários e manifestações…

E fala-se em preservar. Preservar numa política de proximidade.

Importa, por vezes, ter memória.

Em 2007, deu-se início oficialmente a um projeto de salvaguarda do PCI no Alentejo que tinha começado em 2005.

Um projeto que se iniciou na Câmara Municipal de Portel, sob a designação de Jardim do Mundo, e que depois transitou para a recém-criada Direção Regional de Cultura do Alentejo, onde se veio a chamar Programa IDENTIDADES.

Quando este projeto abortou bruscamente na Direção Regional de Cultura do Alentejo, em 2010, ação que se revestiu de um cheiro de aparente santidade, procurando inventar ilegalidades (nunca provadas) como meio de justificar o fim do projeto perante a Região e os vários parceiros envolvidos, e os mais de 150 mil euros de indemnização pagas pelo Estado (que poderiam ter significado antes investimento no Alentejo!), encerrou-se um tempo em que no Sul fomos pioneiros de olhar esta «coisa», agora tão em moda, do imaterial. À altura, ficou lá uma verba de um milhão e tal de euros para se investir em salvaguarda (e não em preservação!)…

Durante três anos, conseguiu-se que cerca de uma dezena de municípios resolvessem investir na coisa. Muitos deles com obras avultadas.

A Casa do Cante em Serpa foi um projeto sobrevivente, feito pela teimosia de uma câmara e de um presidente. A candidatura do Cante Alentejano, tantas vezes adiada, é também desses tempos. Hoje são dois projetos que vingaram, mesmo em tempos tão difíceis.

Mas importa também saber que no Alentejo éramos o modelo. Para o então Ministério da Cultura e para a Comissão Nacional da UNESCO.

Mas esta memória deve ser vista em confronto com o presente, de forma crítica. Sem a nostalgia do passado.

É fácil estar numa cadeira numa qualquer instituição e olhar para o PCI, palavra horrível, na distância patrimonial e fazer um trabalho de inventariação, ou, melhor, catalogação, e apostar na sensibilização.

A minha experiência nestas coisas do imaterial já me diz o contrário. Academizar, institucionalizar, a nada leva. É necessário estar com as comunidades. Antropologizámos a coisa em demasia, quer para o bem quer para o mal.

Pouco importa para os últimos fabricantes de chocalhos, para os cantadores, para os bugios e mourisqueiros, as origens ou se aquilo é imaterial ou material… importa é se volta a acontecer e se os seus filhos e netos o farão.

Ou se têm um transporte…

Pensar antes de mais na dignificação e na sustentabilidade

Um dos meus mestres de vida, Manuel Viegas Guerreiro, costumava perguntar nos júris de doutoramento o que é que o Povo ganhava com aquilo…

Ora esta é que é a questão.

Portugal é um território em vias de ermamento, com uma agricultura que expulsa as pessoas dos seus locais, onde os municípios não conseguem construir processos de fixação e de aumento demográfico… O que fazemos? Inventariamos para memória futura e levamos para museus… É esta a solução? É para melhor conhecimento? Bom, a minha experiência mostra apenas duas coisas: mais de um século de trabalho na investigação não pode ser esquecido e importa olhar com pragmatismo para o presente.

E esse pragmatismo passa por várias coisas Pensar antes de mais na dignificação e na sustentabilidade. Estes são os aspectos nucleares. Não é a transmissão, que agora anda confundida com a institucionalização do ensino. Porque quando institucionalizamos o que agora chamamos de património imaterial é apenas porque ele já está morto, ou estamos a matá-lo.

Ler o presente, significa criar estratégias

Este pragmatismo passa também por ler o presente.

Ler o presente, significa criar estratégias Significa estar.

O património imaterial destes territórios só existirá se for contemporâneo e se houver pessoas que o sintam enquanto vida e não enquanto representação.

Ora é aqui que está todo o problema. Sem ordenamento de território, sem comunidades, sem pessoas como poderá haver património imaterial? Como poderá haver paisagem?

Na Barrada, Reguengos de Monsaraz, são pessoas que já lá não vivem que levantam a Festa da Santa Cruz. Há uns anos o cabelo comprido veio da cabeleira do Senhor dos Passos de Monsaraz.

Em Alcáçovas sobrevivem os últimos chocalheiros… Em Estremoz será vivo o último cantador de Almas que o fazia recorrendo a uma técnica de apertar o peito?

As palavras sábias de Viegas Guerreiro

Num país em que as leis são construídas cada vez mais numa higienização e onde as pessoas pouco contam, importa recordar as palavras sábias de Viegas Guerreiro.

Há pouco tempo, em Aldeia do Rouquenho, recolhi esta declaração. Importa atentar nela…

Grupo Coral Desfrutar Destinos

Declaração

Eu Mateus Maia fundador, responsável e ensaiador, e também cantador – baixo - declaro em nome do Grupo Coral o apoio à candidatura do cante alentejano a património cultural imaterial da Humanidade.

Embora tenhamos uma excelente sede, ela era o Jardim de Infância da Aldeia do Rouquenho o que quer dizer que não temos jovens por esta razão espera o grupo coral que esta candidatura possa ajudar a que os jovens possam amar esta nossa tradição.

É nossa intenção participar neste processo de forma crítica

Aldeia do Rouquenho

9-1-2014

(Assinatura legível)

 
Em finais de Novembro deste ano vai-se decidir se o Cante irá ser ou não património do mundo… talvez este ano se candidate o fabrico de chocalhos… Mas, para lá da festa e dos foguetes, importa saber como fixar as pessoas… dar-lhe futuro. E o futuro passa pela Identidade. Sem antropologias, é claro!


PAULO LIMA





quarta-feira, 5 de novembro de 2014

O burel

















Pré-publicação do artigo que vai sair no n° 16 da revista ALDRABA, atualmente no prelo:

Trata-se dum tecido grosso de cor acastanhada, de origens remotas e fabrico artesanal, implantado na região onde se arreigou, se perpetuou por força das exigências climatéricas da zona, com abundância de matéria-prima e mão-de-obra barata. Feito de lã 100% natural (virgem), o burel foi fazendo história na Serra da Estrela através das capas, peça de vestuário adequado à tarefa dos pastores que ajudavam a suportar as temperaturas adversas, ajustando-se também à rusticidade da paisagem serrana. Contrastando, no entanto, com a brancura da neve em tempos de invernia. É a peça que mais simboliza o burel pelo seu estilo prático e aspeto sóbrio.
De desenho simples e retilíneo, as chamadas capas de burel tornaram-se célebres no corpo dos pastores, servindo para tudo, inclusivamente para manta de agasalho. Mais tarde, passaram a ser peças de vestuário de outra classe social, pela sua sobriedade e exuberância raras. Deixam uma nota de indumentária de luxo e opulência, com o estatuto de gente bem colocada na vida, quando exibidas pelos grandes lavradores do Ribatejo e Alentejo. Lavrador que se prezasse, teria de se apresentar de capa de burel, razão pela qual ganhou a designação de capa alentejana.
Contudo, pelo custo da matéria-prima, passou a perder mercado quando teve de enfrentar tecidos de matérias sintéticas mais leves e de preços altamente competitivos. Quedou-se, por isso, num tempo de completo esquecimento, para depois surgir novamente com ar arrogante no campo da moda. Trata-se, na verdade, de uma peça de vestuário raro, cujo preço fala por si.
A Manufactura do Burel
O Ciclo da Lã
A lã é extraída das ovelhas (velo) através da tosquia que é executada durante os meses de Maio e Junho. Depois da tosquia, a lã é muito bem lavada com água quente e posta a secar, sendo de seguida cardada, passando depois à fase de fiação (operação artesanal com auxilio do fuso e da roca para a transformar em fio). À lã, já fiada, dá-se o nome de maçaroca a qual depois é dobada em novelos, pronta a ser urdida.
A urdidura que consiste em preparar os fios, de alto-a-baixo, paralelos entre si e de igual comprimento. Feita esta, monta-se no tear e procede-se à tarefa de tecelagem. Urdir com lã branca e tecer com lã preta ou castanha é um processo usual que dá outro colorido ao tecido. Todavia, o burel tem apenas uma cor: castanho acinzentado.
Tarefa Seguinte
A lã, depois de tecida, apresenta uma textura pouco consistente, de certo modo rala, razão pela qual passa à pisoagem para garantir maior firmeza e durabilidade ao tecido.
A pisoagem é feita no pisão (engenho artesanal pesado, movido a água, semelhante ao moinho), onde o tecido é batido em água quente, durante algum tempo, por dois enormes martelos, ou malhos de madeira pesados. Assim se transforma numa pasta feltrosa, homogénea, espessa e forte, a que é dado o nome de burel.
Este tecido pode ser submetido a vários tempos - pisão inteiro, meio pisão, ou apenas um quarto de pisão -, consoante o fim a que se destine: capas e samarras, pisão inteiro; saias, meio pisão; aventais, um quarto de pisão.
Finalmente
E, assim, o tal tecido grosso, denominado burel, ficaria em condições de passar às mãos do alfaiate, ou da costureira, os quais transformá-lo-iam em capas, capuchas, saias e aventais.

ADRIANO PACHECO