quarta-feira, 5 de novembro de 2014

O burel

















Pré-publicação do artigo que vai sair no n° 16 da revista ALDRABA, atualmente no prelo:

Trata-se dum tecido grosso de cor acastanhada, de origens remotas e fabrico artesanal, implantado na região onde se arreigou, se perpetuou por força das exigências climatéricas da zona, com abundância de matéria-prima e mão-de-obra barata. Feito de lã 100% natural (virgem), o burel foi fazendo história na Serra da Estrela através das capas, peça de vestuário adequado à tarefa dos pastores que ajudavam a suportar as temperaturas adversas, ajustando-se também à rusticidade da paisagem serrana. Contrastando, no entanto, com a brancura da neve em tempos de invernia. É a peça que mais simboliza o burel pelo seu estilo prático e aspeto sóbrio.
De desenho simples e retilíneo, as chamadas capas de burel tornaram-se célebres no corpo dos pastores, servindo para tudo, inclusivamente para manta de agasalho. Mais tarde, passaram a ser peças de vestuário de outra classe social, pela sua sobriedade e exuberância raras. Deixam uma nota de indumentária de luxo e opulência, com o estatuto de gente bem colocada na vida, quando exibidas pelos grandes lavradores do Ribatejo e Alentejo. Lavrador que se prezasse, teria de se apresentar de capa de burel, razão pela qual ganhou a designação de capa alentejana.
Contudo, pelo custo da matéria-prima, passou a perder mercado quando teve de enfrentar tecidos de matérias sintéticas mais leves e de preços altamente competitivos. Quedou-se, por isso, num tempo de completo esquecimento, para depois surgir novamente com ar arrogante no campo da moda. Trata-se, na verdade, de uma peça de vestuário raro, cujo preço fala por si.
A Manufactura do Burel
O Ciclo da Lã
A lã é extraída das ovelhas (velo) através da tosquia que é executada durante os meses de Maio e Junho. Depois da tosquia, a lã é muito bem lavada com água quente e posta a secar, sendo de seguida cardada, passando depois à fase de fiação (operação artesanal com auxilio do fuso e da roca para a transformar em fio). À lã, já fiada, dá-se o nome de maçaroca a qual depois é dobada em novelos, pronta a ser urdida.
A urdidura que consiste em preparar os fios, de alto-a-baixo, paralelos entre si e de igual comprimento. Feita esta, monta-se no tear e procede-se à tarefa de tecelagem. Urdir com lã branca e tecer com lã preta ou castanha é um processo usual que dá outro colorido ao tecido. Todavia, o burel tem apenas uma cor: castanho acinzentado.
Tarefa Seguinte
A lã, depois de tecida, apresenta uma textura pouco consistente, de certo modo rala, razão pela qual passa à pisoagem para garantir maior firmeza e durabilidade ao tecido.
A pisoagem é feita no pisão (engenho artesanal pesado, movido a água, semelhante ao moinho), onde o tecido é batido em água quente, durante algum tempo, por dois enormes martelos, ou malhos de madeira pesados. Assim se transforma numa pasta feltrosa, homogénea, espessa e forte, a que é dado o nome de burel.
Este tecido pode ser submetido a vários tempos - pisão inteiro, meio pisão, ou apenas um quarto de pisão -, consoante o fim a que se destine: capas e samarras, pisão inteiro; saias, meio pisão; aventais, um quarto de pisão.
Finalmente
E, assim, o tal tecido grosso, denominado burel, ficaria em condições de passar às mãos do alfaiate, ou da costureira, os quais transformá-lo-iam em capas, capuchas, saias e aventais.

ADRIANO PACHECO

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