De seu nome verdadeiro Manuel Nunes da Fonseca, nascido em Ílhavo em 31/7/1920 e falecido em Lisboa em 15/10/2002, Mário Castrim foi um brilhante professor, escritor, poeta e jornalista, que nos cumpre aqui evocar.
Mas a faceta principal do trabalho de Mário Castrim, pela qual foi mais justamente apreciado, foi a de crítico de televisão, profissão que ele praticamente criou, e que desempenhou no "Diário de Lisboa" desde 1965, com as suas crónicas diárias mordazes e acutilantes, e mais tarde com crónicas semanais no "Tal & Qual".
O amigo da Aldraba e também jornalista Viriato Teles, escreveu no "Público" de ontem, 30/7/2020, um sentido comentário acerca do percurso pessoal do Mário Castrim, colega ao qual muito deve, designadamente a decisão de ele próprio se ter profissionalizado como jornalista.
E é Viriato Teles que afirma de Castrim ser um exemplo vivo de como é possível ser-se crente e marxista, em que acreditar em Deus só o poderia levar ao Partido onde entendia estarem os melhores dos melhores e de onde "acreditava poder nascer uma sociedade mais justa, menos desigual - e consequentemente mais divina, porque mais humana".
Na atividade de crítico de televisão, conta Viriato que Mário Castrim passava noites e noites frente ao aparelho, a analisar e escrever sobre o que se passava na RTP, e as crónicas datilografadas eram depois deixadas depois num saco do pão pendurado do lado de fora da porta de casa, onde um estafeta do "Diário de Lisboa" se encarregava de as levantar pela madrugada...
Conta ainda Viriato Teles que Mário Castrim, no princípio dos anos 1990, respondeu a um pedido de opinião do cardeal-patriarca D. António Ribeiro sobre a intenção da Igreja Católica de avançar com o canal TVI, tendo-o desaconselhado vivamente: "Cuidado, vai-se meter com um demónio que não consegue dominar...". O cardeal não ouviu o conselho, e agora vê-se no que deu a TVI!
Hoje, 31/7/2020, numa sessão de homenagem ao centenário de Mário Castrim realizada no Hotel Vitória, Jerónimo de Sousa contou que, também nos anos 1990, lhe foi pedida ajuda para preparar uma entrevista que no dia seguinte o candidato Jerónimo à Presidência da República iria dar à RTP. Castrim compareceu na sede do Partido, mas ripostou liminarmente: "Tu, camarada, com a experiência que tens das lutas nas fábricas, vens-me pedir ajuda? Desculpa, mas não estou à altura para isso". E foi-se embora...
Era assim Mário Castrim: lúcido, frontal, incisivo!
Pessoalmente, deixem-me apenas recordá-lo na sua modéstia, no princípio dos anos 1960, quando ia nas tardes das 4ªs feiras ao meu liceu Pedro Nunes, nas "atividades circum-escolares", dar umas aulas de datilografia, onde aprendi com ele a escrever no teclado HCESAR...
JAF