É com o maior pesar que assinalamos a partida, hoje de manhã, da Manuela Barros Ferreira, após dois meses de graves perturbações neurológicas.
Manuela
Barros Ferreira, mulher do Norte radicada há muitos anos em Mértola,
profissional distinta da língua portuguesa, foi companheira de toda a vida do arqueólogo Cláudio Torres, com quem protagonizou nos anos 1960's uma bem sucedida fuga por mar até Marrocos, onde viria a nascer a sua primeira filha, Nádia. Seguiram-se anos de exílio na Roménia, até poderem regressar a Portugal com o 25 de abril.
A Manuela era amiga da nossa Associação, que sempre nos recebia com muita simpatia quando a encontrávamos em Mértola, e tendo
sido oradora no XVIII Encontro que realizámos em Castro Verde em 2 e 3 de abril de 2011.
Em junho de 2020, publicámos aqui um inspirado texto da Manuela, de que gostaríamos de recordar um excerto:
Grandioso e
formigueiro é o povo das palavras.
Há palavras
vítimas ou triunfantes ou heroínas. As vítimas ficam agarradas a tempos
arrepiantes, multiplicando vítimas entre os seres vivos. “Apocalipse”,
“Holocausto”, “Hiroshima”, “Miséria”. As triunfantes agarram-se com desespero
ao momento que passa, famintas de eco. “Ganhar”. “Vencer”. “Conquistar”.
“Ambição”. As heroínas são as que arrancam alguém à atrocidade do sofrimento.
Ninguém diria, ao ouvi-las, que são heroínas. “Bisturi!” - e o moribundo
revive. “Bombeiros” – e o perigo é debelado. “Coragem!” – e alguém consegue
aguentar mais um pouco, “Segure-se!” – e a velhinha que não conseguia descer as
escadas é levada pelo braço de um príncipe sonhado, como num feitiço de
beladona.
Importantes, as
palavras assassinas: “Fome”, “Sede”, “Morte”, “Dor”, “Ódio”, “Incompetente!”
,“Está despedido!”, “Corrupto!”, “Pedófilo!”, “Austeridade”, “Doença”... além
de ditador, carrasco, tortura, todas com letra pequena por desalmadas que são.
Para as palavras
assassinas e malfeitoras não existem prisões. Elas esvoaçam como as outras, mas
por onde passam deixam um rasto de infelicidade. Enquanto as palavras boas...
as que aparecem em todos os manuais da civilidade, essas fazem o mundo rodar
melhor. “Amor”, “Paz”, “Felicidade”, “Saúde”...“Um copo”.
Em dezembro último, também publicámos aqui um comovente "Conto de Natal" da Manuela Barros Ferreira.
Ao Cláudio, às filhas e aos amigos mais próximos, fica aqui um forte e emocionado abraço de solidariedade da associação Aldraba.
JAF
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