sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Ainda acerca dos nossos 20 anos



Editorial do número 38 da revista "Aldraba":

Ao longo de duas décadas, a Aldraba, enquanto Associação do Espaço e Património Popular, realizou mais de 40 Encontros em torno de valores patrimoniais de diversos concelhos do Centro (como Idanha-a-Nova, Fundão, Tondela) até ao Sul (como Loulé, Mértola, Aljezur).

Esta revista espelhou durante 38 números, em edições semestrais, esses eventos e muita temática relacionada. Com as suas páginas abertas a autodidatas, académicos, associados e amigos, divulgámos artigos acerca de gastronomia, doçaria, territórios (como o Couto Misto), práticas e ofícios onde se inserem moinhos, chafarizes, aldeias de xisto ou paisagens naturais, que são identitárias.

A nossa ida a locais como Querença, Castro Marim, Pias, Moura, Alenquer, Alpedrinha, Póvoa de Atalaia, Fundão, Souto da Casa, Salvaterra do Extremo, Vilarelhos, etc., deixou rasto. Ficou a revista, ficou o nosso compromisso na salvaguarda do saber-fazer, também com os dois cadernos temáticos editados sobre aldrabas e batentes de porta e cataventos do concelho de Moura.

A participação em manifestações culturais, como o Encontro Transfronteiriço de Poesia, Património e Arte de Vanguarda em Meio Rural, que se efectua no final de Julho, em Alfândega da Fé, ou a Festa dos Chocalhos no 3º fim de semana de Setembro, em Alpedrinha, onde recentemente participámos na iniciativa “Ecos dos Chocalhos”, amplia – pela divulgação da nossa revista – a mensagem que, desde a fundação, pretendemos partilhar.

A vida colectiva está ferida de amnésia. O património sofre atentados, como há poucos meses sucedeu no Ginjal (Almada), terraplanando a memória de Romeu Correia e Columbano Bordalo Pinheiro, ali nascidos. Há alguns anos, o Palácio do Barão de Quintela, no Chiado, viu surgirem seis comedouros para turistas. A CML teve pudor em colocar um marco, assinalando que, na 1ª Invasão Napoleónica, Junot alojou-se ali, “comendo à grande e à francesa”, e ficando “a ver navios”…

Chegámos a 2025 mais pobres. Uma parte das lojas tradicionais foram sendo abatidas com rendas incomportáveis, devido à gentrificação que prejudicou bastante outras cidades europeias (Barcelona, Veneza, Dubrovnik).

Centenas de baiúcas emergiram como cogumelos na zona histórica, vendendo o mesmo: águas, cachecóis, souvenirs de cortiça irrelevantes e ímans para frigoríficos, servindo um turismo que vem desenfreado aos milhares por dia, em navios de cruzeiro.

A Aldraba continua a obra iniciada em 25 de Abril de 2005 e desenvolvida por voluntários inesquecíveis, que entretanto partiram pela lei natural da existência. Seguiremos os seus ensinamentos e valores de cidadania, com a vontade de fazer sempre bem e melhor.

Luís Filipe Maçarico

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