Editorial do número 38 da revista "Aldraba":
Ao
longo de duas décadas, a Aldraba, enquanto Associação do Espaço e Património
Popular, realizou mais de 40 Encontros em torno de valores patrimoniais de
diversos concelhos do Centro (como Idanha-a-Nova, Fundão, Tondela) até ao Sul
(como Loulé, Mértola, Aljezur).
Esta
revista espelhou durante 38 números, em edições semestrais, esses eventos e
muita temática relacionada. Com as suas páginas abertas a autodidatas,
académicos, associados e amigos, divulgámos artigos acerca de gastronomia,
doçaria, territórios (como o Couto Misto), práticas e ofícios onde se inserem
moinhos, chafarizes, aldeias de xisto ou paisagens naturais, que são
identitárias.
A
nossa ida a locais como Querença, Castro Marim, Pias, Moura, Alenquer,
Alpedrinha, Póvoa de Atalaia, Fundão, Souto da Casa, Salvaterra do Extremo,
Vilarelhos, etc., deixou rasto. Ficou a revista, ficou o nosso compromisso na
salvaguarda do saber-fazer, também com os dois cadernos temáticos editados
sobre aldrabas e batentes de porta e cataventos do concelho de Moura.
A
participação em manifestações culturais, como o Encontro Transfronteiriço de
Poesia, Património e Arte de Vanguarda em Meio Rural, que se efectua no final
de Julho, em Alfândega da Fé, ou a Festa dos Chocalhos no 3º fim de semana de
Setembro, em Alpedrinha, onde recentemente participámos na iniciativa “Ecos dos
Chocalhos”, amplia – pela divulgação da nossa revista – a mensagem que, desde a
fundação, pretendemos partilhar.
A
vida colectiva está ferida de amnésia. O património sofre atentados, como há
poucos meses sucedeu no Ginjal (Almada), terraplanando a memória de Romeu
Correia e Columbano Bordalo Pinheiro, ali nascidos. Há alguns anos, o Palácio
do Barão de Quintela, no Chiado, viu surgirem seis comedouros para turistas. A
CML teve pudor em colocar um marco, assinalando que, na 1ª Invasão Napoleónica,
Junot alojou-se ali, “comendo à grande e à francesa”, e ficando “a ver navios”…
Chegámos
a 2025 mais pobres. Uma parte das lojas tradicionais foram sendo abatidas com
rendas incomportáveis, devido à gentrificação que prejudicou bastante outras
cidades europeias (Barcelona, Veneza, Dubrovnik).
Centenas
de baiúcas emergiram como cogumelos na zona histórica, vendendo o mesmo: águas,
cachecóis, souvenirs de cortiça irrelevantes e ímans para frigoríficos,
servindo um turismo que vem desenfreado aos milhares por dia, em navios de
cruzeiro.
A
Aldraba continua a obra iniciada em 25 de Abril de 2005 e desenvolvida por
voluntários inesquecíveis, que entretanto partiram pela lei natural da
existência. Seguiremos os seus ensinamentos e valores de cidadania, com a
vontade de fazer sempre bem e melhor.
Luís Filipe Maçarico

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