Vasco Graça Moura faleceu no final do mês de abril de 2014. Apenas 6 meses antes, em novembro de 2013, publicou o interessante ensaio "A identidade cultural europeia", de que vamos respigar alguns extratos que dizem respeito às preocupações da ALDRABA:
A herança cultural é o conjunto de elementos que permitem a um determinado grupo reconhecer-se como portador de uma identidade própria e comunicar ao longo do tempo, quer no interior desse grupo quer, pela marcação de uma diferença, para fora dele.
Essa herança cultural passa por muitos e variados elementos, desde logo pela língua materna e pela família a que esta pertença, e depois pelo património material e imaterial, pelos costumes e tradições, pelos condicionamentos, adaptações e morfologias impostos pela História, pela geografia, pelo clima...
A herança cultural resulta de um longo processo de existência das sociedades implantadas no espaço e no tempo, em interacção com factores da mais variada ordem. Tem uma dimensão espiritual e antropológica, ligada a escalas de valores humanos identitários, éticos, estéticos, afectivos e outros.
Por isso mesmo, da herança cultural decorrem consequências importantes para todos os aspectos da vida política, social e económica.
Uma das obrigações mais prementes da cidadania, tal como entendemos que hoje deveria ser praticada, consiste em procurar colmatar o fosso muito acentuado que existe entre as gerações mais jovens e as componentes principais integradoras dessa herança.
Parece pois evidente que, além dos riscos que mencionarei de seguida, existe um outro, cada vez mais próximo: o da indiferença dos mais novos em relação a ela.
Com efeito, a herança cultural está constantemente em perigo, quer pela passagem do tempo, mesmo quando o seu efeito é mitigado, quer pelo efeito devastador das catástrofes, humanas ou naturais, sobre a realidade material e as instituições, quer pelas consequências mais dificilmente controláveis de fenómenos como a globalização e a generalização de certas tecnologias.
Umas e outras, podendo e devendo embora proporcionar uma dinâmica interactiva e um contacto de que as culturas normalmente beneficiam, tendem a instalar progressivamente uma dimensão redutora, banalizadora e empobrecedora das características e modalidades da vivência do património.
E, todavia, a herança cultural encontra-se sedimentada na memória colectiva e nas valências simbólicas que apresenta, testemunhando permanentemente a criatividade do espírito e a luta e afirmação do homem contra o meio adverso.
É portadora de um sentido enriquecedor da condição humana, devendo ser vista como parte de um sistema complexo e muito variado.
Esse sistema engloba, entre muitas outras realidades em permanente interacção, obras de arte, monumentos, dimensões religiosas e profanas, testemunhos literários, cénicos e musicais, valores arquitectónicos e artísticos, padrões estéticos, matrizes eruditas e populares, ideias, valores sociais, marcas e vestígios das gerações passadas e da sua luta pela emancipação e por uma vida melhor...
Vasco Graça Moura
Obrigada Zé ( José Alberto Franco) pelo texto que partilhas.O que poderá ser a identidade cultural europeia? A UE terá capacidade de gerar uma cultura própria para além da burocracia de Bruxelas ou das políticas aprovadas no PE? Apenas o somatório dos traços (mais) distintivos de todos os países ou dos países com maior poderio dentro da UE? Enunciados tão vagos em que nenhuma das comunidades se conseguirá rever?
ResponderEliminarMEG