sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Ecos do lançamento do nº 24 da revista ALDRABA

















Graças a Jacqueline Aragão temos uma breve reportagem fotográfica da apresentação da revista 24 da Aldraba, com uma intervenção de Santiago Macias, tão dinâmica, que originou muitas intervenções da assistência. 

O Professor destacou a longevidade e regularidade da revista e sublinhou a importância da fixação da memória e a atenção dada às coisas supostamente pouco importantes, num contexto de diversidade dos patrimónios, abordados na revista da Aldraba.

"O ritmo certo implica esforço e muita disciplina de quem coordena" - afirmou. 

E acrescentou ainda: "Afastámo-nos do mundo rural", citando Barceló: "O poder não quer saber dos camponeses!"


Comentário de uma amiga da Associação que assistiu de novo a um lançamento da revista: "O Santiago motivou as pessoas a lerem e não foi exaustivo!"


LFM (fotos de Jacqueline Aragão)

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

UNESCO – Reggae e decisões de Património Mundial relativamente a Portugal



A "UNESCO acaba de declarar o Reggae jamaicano património imaterial da Humanidade, destacando "a contribuição" desta música para a consciência internacional "sobre questões de injustiça, resistência, amor e humanidade", graças a artistas como Bob Marley".

A propósito desta decisão, divulgada hoje, lembro as classificações de Património Mundial decididas pela UNESCO relativamente a Portugal:

 (https://pt.wikipedia.org/wiki/Lista_do_Patrim%C3%B3nio_Mundial_em_Portugal)
1983
·         Centro histórico de Angra do Heroísmo (Açores),
·         Mosteiro da Batalha,
·         Mosteiro dos Jerónimos/Torre de Belém (Lisboa) e
·         Convento de Cristo (Tomar).
1986
·         Centro histórico de Évora.
1989
·         O Mosteiro de Alcobaça.
1995
·         A paisagem cultural de Sintra.
1996
·         O centro histórico do Porto.
1998
·         A Arte Rupestre do Vale do Rio Côa.
1999
·         A Floresta Laurissilva da Madeira.
2001
·         O centro histórico de Guimarães.
·         O  Alto Douro Vinhateiro na lista.
2004
·         A Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico.
2011
·         O Fado.
2012
·         A maior fortificação abaluartada do mundo, em Elvas, foi classificada como Património Mundial.
2013
·         A Universidade de Coimbra.
·         No mesmo ano, a dieta mediterrânica foi classificada como Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO.
2014
·         O cante alentejano, canto coletivo, sem recurso a instrumentos e que incorpora música e poesia.
2015
·         O fabrico de chocalhos em Portugal, ofício e manifestação cultural que tem no Alentejo a sua maior expressão a nível nacional.
2016
·         O processo de fabrico do barro preto de Bisalhães, em Vila Real.
·         A falcoaria portuguesa, através depois de uma candidatura apresentada pelo município de Salvaterra de Magos (distrito de Santarém).
2017
·         A produção dos "Bonecos de Estremoz (distrito de Évora).

 MEG

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Santiago Macias apresenta o nº 24 da revista ALDRABA na 4ª feira, 28 de novembro

















Na Casa do Concelho de Góis em Lisboa (Rua de Santa Marta, 47 r/c Dtº, próximo do Mq.Pombal) irá ter lugar, pelas 19 horas do próximo dia 28 de novembro, 4ª feira, a apresentação pública do nº 24 da nossa revista.

O historiador e arqueólogo Santiago Macias vai dar-nos a honra de apresentar a revista.

Todos os associados e amigos são convidados a comparecer.

Sumário da revista ALDRABA, nº 24:

EDITORIAL
As oliveiras milenárias, um património ímpar
João Coelho

OPINIÃO
O espírito inovador de Francisco Grandella
Ana Isabel Veiga e Luís Filipe Maçarico

PATRIMÓNIO IMATERIAL
As minhas brincadeiras
Romão Trindade

LUGARES DO PATRIMÓNIO
Museu Nacional: Memória e lamento
Diana Alves
A história de um encontro do património transfronteiriço
Luís Filipe Maçarico
Viajar, sonhar, reviver…
Luís Cangueiro e Andreia Gomes Martins

ASSOCIATIVISMO E PATRIMÓNIO
Historial do Orfeão da Comenda “Estrela da Planície”
Manuel Morais

RITUAIS, TRADIÇÕES E REALIDADE
Rocha Peixoto: o etnógrafo estudioso dos “ex-votos”
J. Fernando Reis de Oliveira

ARTES E OFÍCIOS
João Pintassilgo - mestre oleiro João Mértola do Redondo
Paulo Silveira

SONS COM HISTÓRIA
Os carrilhões de Mafra: do desconhecimento à incompreensão de um património
José Nelson Cordeniz

MEMÓRIAS DO TRABALHO
Comenda, Castelo Cernado, Ferraria e Vale da Feiteira - terras de carvoarias e carvoeiros
Jorge Branco

OS AMIGOS E A MEMÓRIA
Memórias dispersas
Rosa Honrado Calado

ALDRABA EM MOVIMENTO
Maio a Outubro de 2018

Maria Eugénia Gomes

sábado, 17 de novembro de 2018

Memórias dispersas



















Pré-publicação do artigo que a nossa associada Rosa Honrado Calado escreveu, acerca do seu tio João Honrado, para o n.º 24 da revista ALDRABA, que se encontra no prelo:

Nascer no país mais ocidental da Europa virado para o mar, com uma superfície geográfica e humana diversificada e atraente, na 2ª metade  do séc. XX, também é um acto de “pontaria”.
As discrepâncias de vida, o atraso geral em relação ao continente europeu, a que pertence, eram assinaláveis.
A geração dessa época foi marcada por um governo autoritário e vigilante que tornou a vida deste país “tranquila, ordenada, pacata, vigiada, segura, etc, etc…”, de tal modo que até as chocantes assimetrias sociais impunham-se e não podiam ser referidas. Eram “naturais”.
Pronto, está descrito o local destas memórias que vão remontar a uma vila alentejana, interior, situada mais a sul.
Num 1º cenário, sabemos pelo povo da vila duma notícia – “vai haver um casamento”. Todos conhecem as famílias dos noivos, eles vão casar em casa, pelo registo. A boda é caseira, mas preparada com o que de melhor se pode arranjar. As portas da casa estão abertas para receberem os amigos, vizinhos e família, como era de tradição.
Todos se conhecem. Acolá, vê-se ali um moço alto, um pouco desengonçado, curioso, falador, brincalhão, mas sempre atento, é o irmão mais novo do noivo, o João. Este moço já era conhecido como contestatário, ”contra o Salazar”, pois até já tinha estado preso em Caxias por ter ousado distribuir panfletos contra o ditador, no teatro Pax Julia, em Beja. Tinha amigos e camaradas, entre eles o irmão mais velho (o noivo), que em 1945, na calada da noite, pintaram as paredes do cemitério, a zona mais alta da vila, e deitaram foguetes para saudar o fim da guerra e a vitória dos aliados.
Mas, naquele dia, dia de festa, de casamento, o que o povo de Ferreira, os convidados e amigos não esperavam era assistir àquele insólito fim de festa. Sim, os agentes da PIDE entraram pela sala da boda e prenderam o jovem João Honrado. Muitos seguiram com protestos o carro que o encarcerava, outros choravam e não se conformavam. A vila assistia a mais uma repressão que ficaria sem resposta, gravada na memória de muitos. Depois duma boda com um triste final, que marcou a família e o povo daquela vila, o João passou mais alguns meses nas masmorras das cadeias políticas, onde contraiu tuberculose e sob prisão foi transferido para um sanatório no Caramulo. Saiu da cadeia em 1954 e entra de imediato na clandestinidade.
Nas casas da família Honrado, falava-se com muitos silêncios e cautelas quando o tema era o tio João. Ninguém sabia onde estava, como estava, dizia-se: “deve estar bem”, “preso não está”, “seguiu o caminho da sua luta”. Durante 7 anos, na “Pensão Honrado”, onde ficaram a morar o casal (da triste boda) e mais uma filha que veio aumentar o agregado, surgiam pessoas que falavam baixo, não saíam dos quartos, pareciam “sombras”, trocavam papéis e rapidamente desapareciam.
Em Fevereiro de1958, morreu António José Honrado, o patriarca da família, de morte súbita. Os algozes planearam que o filho clandestino poderia, disfarçadamente, comparecer. Lá dentro chorava-se o ente querido, o ausente e o cerco policial. Os amigos que chegavam mais embuçados eram destapados e durante o funeral o cordão policial manteve-se vigilante até ao cemitério. A nossa família estava arrasada, os amigos e as gentes da cidade puderam comprovar como eram desrespeitados os momentos mais dolorosos duma família. Dias depois, ainda me recordo de ter chegado com os meus pais a casa dos meus avós e ter deparado com um cenário inaudito: roupas, louças, gavetas, malas foram despejadas e desarrumadas. Era mais uma busca. Foi mais um cenário que não dá para esquecer. A minha avó, mulher firme e lutadora, manteve-se sempre à frente de mais esta “prova”.
Em 1962, através da imprensa, soubemos que o tio João fora preso em Coimbra e recomeça mais um calvário, porque não obtínhamos mais notícias. Durante meses, os irmãos percorreram repartições, fizeram pedidos, requerimentos e regressavam só com o desalento. Foram meses duma espera dolorosa. Sabíamos e sofríamos com a convicção de que o nosso ente querido estava a ser torturado e a sofrer as piores sevícias. Passados meses, pudemos visitá-lo no Forte de Peniche. Separadas as visitas dos reclusos por vidros e balcões de pedra, conseguíamos ainda detectar as marcas das torturas físicas e psicológicas. Inicia-se um período de incertezas, de visitas ultracontroladas, de proibições. Preparávamos, durante semanas, o que podíamos levar de Beja a Peniche, percorríamos com ansiedade tantos quilómetros, mas a visita podia ser proibida. Porquê? Porque ao batermos ao portão e, após aguardarmos as inspecções sobre as encomendas que entregávamos, podíamos ouvir do guarda a comunicação, dita com alguma alegria: ”o sr. Honrado está proibido de receber visitas”, sem mais explicações. Claro, vínhamos depois a saber que tinha entrado, com outros camaradas, numa greve de fome ou participado no protesto contra as bárbaras condições que havia dentro das cadeias.
Em 1963, fomos surpreendidos com a notificação de que tínhamos de nos dirigir, rapidamente, à cadeia do Porto, onde iriam entregar-nos uma criança de 3 anos, filha do tio João e duma camarada, nascida durante a clandestinidade. O processo foi do mais célere, porque a menina estava gravemente doente e seria um escândalo internacional se o pior viesse a acontecer. A nossa família recebeu a menina quase em estado de coma. Felizmente, graças aos cuidados da família e de muitos amigos, a minha prima sobreviveu. Mais haveria para contar, mas fico por aqui.
Em modo de fecho, quero apenas explicar que decidi escrever estas memórias porque sei que há toda uma geração que, passados 44 anos sobre o Dia da Liberdade, o nosso 25 de Abril, desconhece ainda episódios da história negra da ditadura, que assolou e marcou este país.
Quero terminar com uma mensagem de optimismo, contando que o tio João viveu e lutou intensamente após o 25 de Abril, sem mágoas, sem vinganças, com alegria e sempre querendo fazer mais e mais, até ser impedido pela doença.
Como não sei defini-lo melhor, tive a sorte de ter encontrado, escrita pelo nosso amigo Eduardo Olímpio, a definição que subscrevo:

“O João foi doutorado em Alentejo e Amor”.

Rosa Honrado Calado

sábado, 10 de novembro de 2018

As estafetas (2)














Reproduz-se hoje a segunda metade da crónica publicada no”Diário do Alentejo” de 31.8.2018:


AS ESTAFETAS (2)
(...)

Já as idas a Lisboa eram mais para levar do que trazer - eram os frangos para a família, o pão para um filho cheio de saudades dele, as linguiças, os paios, os bocados de presunto, os queijinhos, tudo dentro de alcofas, por vezes, bem pesadas. Mas havia sempre alguém para ajudar - os estafetas conheciam-se todos uns aos outros e eram solidários.

Depois, metiam-se no comboio, de madrugada, e ainda tinham de fazer o transbordo no Barreiro - mudavam-se, com toda a carga, para o cacilheiro e lá atravessavam o Tejo, numa viagem longa e aborrecida, sempre com a capital à vista. É uma viagem linda, mas não para quem a tem que fazer por obrigação.

E na estação, dita de Sul e Sueste, desembarcavam para o Terreiro do Paço, e toca de apanhar um elétrico a caminho das voltas de obrigação.

No regresso, com os mandados dos fregueses, repetiam a viagem em sentido contrário. E, além das encomendas, traziam sempre as últimas novidades de Lisboa - dos boatos da política, dos teatros e dos cinemas, do que viram nas montras.

Ao chegar à estação de Alvito, a dois quilómetros da vila, ao fim da tarde, havia dois carros de canudo, os churriões do Quinito e do Afogadinho, e um deles, não me lembro qual, trazia a Ameijoinha para cima, cabeceando no banco, cansada mas tendo ainda que cumprir a tarefa de entregar as encomendas aos clientes.

E tudo por uns tostões...

Maria Antónia Goes