UM HOMEM SÁBIO
Entrar
no MUSEU ETNOGRÁFICO LOUZÃ HENRIQUES,
na Lousã, é entrar no tempo silencioso da História, é percorrer o modus vivendi das corajosas gentes que
nos precederam, é beber a valiosa essência patrimonial que chegou até nós pela
mão generosa deste vulto da cultura portuguesa.
O
Dr. Louzã Henriques, um ilustre
psiquiatra residente em Coimbra - e que tive a honra de conhecer - é dessas
raras figuras que têm o dom de nos surpreender pela sabedoria que delas emana.
Conversar com o Dr. Louzã Henriques
é conversar com a própria História, é ler vários livros ao mesmo tempo, tal a
diversidade de conhecimentos que, como ninguém, sabe transmitir.
Este
homem ecléctico revelou-se um apaixonado investigador na área da Etnografia e
da Antropologia. Todavia, não se ficou pelo estudo teórico desses assuntos. Com
efeito, dedicou grande parte do seu tempo e do seu pecúlio a coleccionar
objectos oriundos da nossa matriz cultural, parte dos quais constituem o acervo
do Museu com o seu nome que a Câmara Municipal da Lousã erigiu e, em boa hora,
abriu ao público em 2005.
Senhor
de rara grandeza ética, cultural e humana, esta figura singular seria
merecedora do reconhecimento nacional - embora saibamos quão avesso é a
homenagens -, já que tão maltratado foi pelo anterior regime que o silenciou na
prisão de Peniche e o impossibilitou de prosseguir a carreira académica na
Universidade de Coimbra e de exercer Medicina em hospitais públicos.
NO MUSEU
No
rés-do-chão, extasiamo-nos com a grandiosidade do espaço e do que se nos
oferece ao olhar: muitos carros de bois
(e também de mula), dos mais diversificados modelos.
As
paredes encontram-se revestidas com um elevado número de cangas – mais de quarenta – de proveniências variadas. Há cangas
para todos os gostos, das mais simples, usadas no dia a dia, às cangas de
festa.
Num
outro sector, as paredes exibem um número inimaginável de modelos de foices, de enxadas e de forquilhas,
enquanto no solo se alinham diferentes tipos de trilhos, utensílios com que se debulhavam os cereais na eira.
Noutros
espaços, uma infinidade de cestos de
verga e uma verdadeira montra de cerâmica/olaria.
Neste
mesmo piso, muitas outras unidades despertam a nossa atenção, entre elas: arados, albardas, padiolas, coalheiras e até uma colecção de
instrumentos musicais também pertença do Dr. Louzã Henriques e aqui colocada
para assinalar o Dia Mundial da Música.
Sendo
o 1º piso ocupado por uma Sala de Exposições Temporárias, onde artistas mostram
as suas obras, no 2º andar, a exposição permanente encontra-se agrupada nos
seguintes núcleos: COZINHA SERRANA, PÃO, APICULTURA, LINHO/LÃ e FERREIRO.
No
alto da escadaria, deparamos com a COZINHA
SERRANA incluindo todos os seus apetrechos, sem esquecer as panelas de
ferro e, bem acima delas, os paus nos quais se enfiavam os enchidos para
curtimento pelo fumo. Vejam-se os antigos moinhos de café e a pequena mesa
posta.
A
ilustrar o tema PÃO, dois painéis
ostentam manguais ou malhos e pás de padejar na eira enquanto expositores
mostram crivos e medidas de cereal e ainda bilhas para medir o azeite. Neste
departamento, sobressai a erguedeira que servia para separar o grão da palha.
No
sector da APICULTURA, todos os
utensílios inerentes, a saber: cortiços, máscara e fumigadores.
No
espaço dedicado ao LINHO/LÃ, atrai a
atenção um curioso engenho, de nome ripo, utilizado para separar
a baganha (onde se encontram as sementes) dos molhos de linho. Refira-se ainda
a dobadoura para fazer novelos de linho ou de lã e a caneleira com roda de
fiar.
Na
secção do FERREIRO, o olhar recai no
grande fole que servia para atear o fogo na forja e num painel com outros
objectos usados neste ofício.
Este
andar oferece outros centros de interesse, designadamente: cestos, cangalhas
(usadas sobre os burros), mós manuais para transformar o grão em farinha,
francelas, utilizadas para amassar o queijo e deixar escorrer o soro, tripeças
e objectos com os quais se separavam as fibras têxteis da palha, uma
interessante peça que servia de medida para pagamento da côngrua e outros.
De
referência obrigatória, a mesa de sapateiro e todos os seus pertences.
O
vestuário característico das diferentes regiões é uma constante. Permito-me
destacar o fato de pastor, a croça, constituída por um colete, caneleiras e uma
capa.
Quem
se deslocar a esta região do país, não deixe de visitar este museu, fruto do
espírito empreendedor e do amor sem limites do Dr. Louzã Henriques!
A
minha homenagem ao homem, ao médico, ao pedagogo, ao investigador, ao
coleccionador de uma vida inteira, pelos horizontes do conhecimento que nos
abriu.
Zulmira Bento
Oportuna evocação.
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