sábado, 13 de outubro de 2018

Oliveiras milenares























Pré-publicação do editorial do n.º 24 da revista ALDRABA, que se encontra no prelo:

AS OLIVEIRAS MILENÁRIAS, UM PATRIMÓNIO ÍMPAR

Temos vindo a assistir ao derrube inconsciente de oliveiras centenárias e milenárias pelas mais diversas razões – plantio de novo olival, construção de vias e edificações -, ignorando-se todo o seu valor e simbolismo, nos planos ambiental, histórico e económico. E, com isso, perdem-se memórias, fere-se a paisagem, perde-se a qualidade no azeite.
As oliveiras das modernas explorações tornam-se menos duradouras e resistentes às condições climáticas, ao serem submetidas a ações sucessivas de poda, de rega e a uma exploração mais intensiva.
Em Portugal existem ainda muitas oliveiras milenárias, das quais destacamos:
- Em Loures. A oliveira milenária de Santa Iria de Azóia, que esteve em risco de ser derrubada para se alargar uma rotunda, mas a comunidade movimentou-se e hoje tem-na como um património muito seu.
- Em Tavira. A oliveira bimilenária do aldeamento de Pedras d`El-rei;
- Em Abrantes. A oliveira trimilenária das Mouriscas, cuja idade, de 3.350 anos, foi cientificamente comprovada, em 2016, pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
Esta durabilidade advém, segundo os seus estudiosos, como Stéphane Moreaux, da enxertia de um zambujeiro, árvore da sua espécie, conhecido também por oliveira silvestre.
A origem da oliveira, segundo a história, remonta à Era Terciária, situando-se na Ásia Menor, onde foram encontradas folhas fossilizadas, datadas do Neolítico. Mais tarde, veio a difundir-se em torno do Mediterrâneo, zona em que assumiria uma invulgar proeminência na sua paisagem e gastronomia.
Desde a antiguidade, a oliveira tem sido associada a manifestações culturais, a usos gastronómicos e medicinais e a práticas religiosas. Na Bíblia e no Corão, ela é a árvore mais referida e venerada. “O ramo verdejante trazido pela pomba a Noé não poderia ser outro que não um ramo de oliveira” (Génesis).
Da sua madeira faziam-se cetros reais e com o azeite ungiam-se monarcas, atletas e sacerdotes. Daí o ser considerada símbolo da sabedoria, da paz e da abundância.
Foi cantada por Homero, Ovídio, Virgílio e Plínio. “E com um ramo de oliveira o homem se purifica” (Virgílio, Eneida).
A oliveira constitui, sem dúvida, o elemento mais identitário do património natural dos países do Mediterrâneo, juntamente com a azinheira e a videira. E o seu azeite é o ingrediente fulcral da sua denominada dieta.
A palavra azeite deriva do vocábulo árabe al-zait que significava “sumo de azeitona”. Um sumo mítico, bíblico e histórico, servindo até de apelativo à verdade: “o azeite vem sempre ao de cima”.
A oliveira é um ser vivaz e resistente, de folhagem perene e violácea, que se inclina sempre para a luz e sendo também luz: na mesa, no candelabro, na candeia,… E que Van Gogh tão bem pintou, mas confessando: ”Mas é bem difícil. Mas isso convém-me e atrai-me no ouro e na prata. E talvez um dia faça delas uma interpretação pessoal, como os girassóis estão para os amarelos”.
Por tudo isto, a oliveira é uma árvore singular e ímpar da natureza, da vida e cultura mediterrânica. Mas não só. Pela realidade que as oliveiras milenárias encerram e representam, impõe-se que o Governo - com meios e legislação adequada -, as autarquias e as associações do património cultural concorram para garantir a sua defesa, conservação e preservação.
A Aldraba fará o possível para assumir a sua responsabilidade, na sensibilização e cooperação.
João Coelho


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