domingo, 14 de setembro de 2014

O contraste campo-cidade em Maria Lamas
















A grande jornalista e escritora Maria Lamas (1893-1983), foi outra corajosa intelectual antifascista, perseguida e presa várias vezes pela PIDE. Escreveu nos jornais Correio da Manhã, Época, A Capital, Diário de Lisboa e O Século, tendo dirigido neste último o suplemento Modas & Bordados. Nesta atividade, dedicou-se incansavelmente ao esclarecimento das mulheres trabalhadoras, pouco conscientes dos seus direitos. Escreveu contos infantis e estudos na área da mitologia, porém o seu livro mais importante, fruto de dois anos de viagens por todo o país, foi «As Mulheres do Meu País». Esteve exilada por diversas vezes, entre 1953 e 1962. Passados sete anos regressou do exílio. Tinha 76 anos e ainda a mesma esperança de melhores dias para Portugal. Viveu o 25 de abril de 1974 com enorme alegria. Tal como Fernando Lopes Graça, Maria Lamas também deixou nos seus escritos, acerca da situação das mulheres portuguesas, importantes reflexões sobre a dicotomia entre o rústico e o urbano, que interessam a todos os que se preocupam com o património popular.

Aqui ficam algumas dessas reflexões, para já sobre a condição camponesa:

“Sempre sozinha na labuta, fêmea submissa ao instinto da procriação, a garantir a multiplicação de braços para amanho do casal, animal de carga, sem uma réstia de sol a penetrar-lhe no espírito, a mulher endurece, desumaniza-se, perde, até, o doce instinto da proteção maternal, como perde toda a frescura e graça mal passa os vinte anos. Antes dos trinta, está desdentada, o cabelo torna-se-lhe baço; a pele murcha; o olhar perde toda a expressão de alegria interior, toda a suavidade”.
(ML, As mulheres do meu país, 1950)

E sobre a condição operária:

“O trabalho coletivo, a disciplina dos horários, a noção da responsabilidade, o contacto com as organizações industriais, o alargamento do convívio com outras mulheres e homens, numa camaradagem benéfica, contribuem, é certo, para lhe dar uma nova personalidade, de que ela própria nem sempre se apercebe, mas que a vai distanciando da camponesa”.
(ML, op.cit., 1950).
Fotografia reproduzida do blogue “O Leme”
Citações extraídas de José Neves, Comunismo e nacionalismo em Portugal, Lisboa, 2008.

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