Como nas aldeias e vilas, também em alguns bairros da grande cidade ainda sobrevive o convívio gregário dos seus moradores, os vizinhos conhecem-se pelos seus nomes, interessam-se pelas vidas, pelos sucessos e pelas preocupações uns dos outros.
Neste contexto, desempenham importante papel os pequenos estabelecimentos comerciais de bairro, as leitarias, as mercearias, os talhos, os capelistas, os cafés, as casas de comidas, os sapateiros, as retrosarias, as lojas de móveis, os barbeiros, as drogarias.
Em Lisboa, entre o Areeiro e a Alameda Afonso Henriques, fica um desses bairros em que a escala humana resiste e se afirma. É o chamado Bairro dos Actores, parte integrante da freguesia do Alto do Pina, que se desenvolve entre uma dúzia de pequenas ruas paralelas ou perpendiculares à Av. Almirante Reis.
Na rua Actriz Virgínia, podemos encontrar (visitar e fazer compras...) a Drogaria Sali, instalada no mesmo local desde há mais de 50 anos, e cujo proprietário, o Sr. António Pires, vai completar em breve 60 anos initerruptos nesta profissão.
Hoje em dia, em que a saúde do proprietário já não lhe permite passar os dias inteiros atrás do balcão, são o seu filho Jorge Pires e a empregada de quase 20 anos de casa, D. Edite Branco, que asseguram o atendimento cuidadoso e personalizado da clientela.
Na Drogaria Sali há de tudo, desde os artigos domésticos de higiene aos produtos químicos para a horticultura, desde as bonecas para crianças aos pequenos electrodomésticos, desde as loiças de cozinha aos utensílios de plástico, dos materiais de jardinagem às ferragens, à espuma para almofadas, aos insecticidas e raticidas, enfim, tudo o que uma casa pode necessitar...
Mas não pensem que esta casa de comércio se desenvolve ao longo de um espaço extenso ou de uma grande superfície. Não, a área do chão da loja não será mais de 4 m2... Só que, com um pé direito de mais de 5 metros, e graças ao enorme escadote (e à perícia de quem ali trabalha), tudo se encontra, tudo é fornecido com uma palavra de simpatia e de explicação ao cliente, que tem ali três amigos e até, se necessário, quem lhe ensine a bem aplicar o produto.
"Tem arame para um estendal? Um momento, aqui está ele, quantos metros quer que lhe corte?"
"Tem decapante para limpar a cera do soalho? Sim, claro, arranjo-lhe um litro avulso numa garrafa de plástico, que as embalagens de 5 litros são caras e não vai precisar de tanto..."
É este "regresso ao passado", este reviver de uma relação amigável entre o consumidor e o comerciante, que a drogaria do meu bairro demonstra ser possível!
JAF (texto e fotografias, à excepção da primeira - reproduzida da revista Atlantis, Jan-Fev.07)
Apreciei imenso, embora não tivesse deixado comentário, este artigo. Original e muito interessante, evoca-se aqui o espírito do comércio de bairro, tradicional, que revive nas feiras. Parabéns pela riqueza do tema abordado.
ResponderEliminarFelizmente que este tipo de comércio de pequena dimensão hoje em dia ainda não se perdeu de todo. Não há "grandes superfícies" que substituam aquele atendimento personalizado, quase familiar, que me tem acompanhado um pouco por todos os lugares onde vivi. A simpatia com que, por norma, somos atendidos, a paciência na escolha ou aconselhamento dos produtos pretendidos, o conhecerem-nos pelo nome e não pelo cartão multibanco, são insuperáveis. Reportam-me não só à infância da mercearia do sr. Rafael ou do "lugar" e tasca do "João da hortaliça", mas também à actualidade da Estrela da Manhã, do sr. Jacinto e da d. Arlinda, que estranham a minha ausência quando não passo por lá para a bica matinal.
ResponderEliminarO facto de se tratar maioritariamente de pequenas empresas familiares poderá suscitar um certo cepticismo quanto ao seu destino, mas a verdade é que para as pequenas compras do dia-a-dia serão sempre necessárias. É esta a marca de esperança que faz com que esse tradicional e acolhedor comércio de bairro não seja definitivamente arrasado pelo "tsunami" capitalista.
MPA
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