sábado, 13 de fevereiro de 2010

A "Aldraba" no "Café Portugal"



A revista electrónica CAFÉ PORTUGAL, dedicada aos "prazeres de viagem e de passeio", e que é animada pelo conceituado jornalista Rui Dias José, quis distinguir a Associação Aldraba numa das suas últimas edições.

A repórter Sara Pelicano entrevistou Luís Filipe Maçarico e José Alberto Franco, e daí resultou a crónica que aqui reproduzimos, com a devida vénia:


«Trus, trus», portas e aldrabas também contam histórias

Pormenores discretos, as portas e aldrabas contam histórias, enchem memórias, são uma feição do nosso património pouco referenciada. Uma realidade que a Associação Aldraba quer proteger e dar a conhecer. O caderno temático «Aldrabas e Batentes de Porta - Uma reflexão sobre o património imperceptível» revela algumas curiosidades sobre portas, aldrabas e batentes, tal como a simbologia de cada um destes elementos que ainda são preservados com orgulho em algumas localidades do país.

«A figura da aldraba sempre me fascinou: no Montijo e em Vila Franca de Xira lembro-me de ficar a olhar para as poucas aldrabas que por lá vi entre os meus seis e os meus quinze anos. Isto porque já havia campainhas, mas o uso da aldraba é assim como uma viagem no tempo. Com a aldraba o mundo era mais quente e tudo era mais próximo nas relações ente as pessoas. Hoje as pessoas comunicam por telemóvel ou por e-mail mas nunca se sabe onde está a pessoa com quem estamos a falar. Com a aldraba a gente sabia». Este excerto é parte do depoimento do poeta e jornalista José do Carmo Francisco no caderno temático «Aldrabas e Batentes de Porta - Uma reflexão sobre o património imperceptível», de Luís Filipe Maçarico. O caderno temático foi editado pela Aldraba – Associação do Espaço e Património Popular que visa precisamente salvaguardar as memórias de pessoas como José do Carmo Francisco, que na meninice utilizavam um engenho de ferro pendurado na porta para anunciar a sua chegada.

Recuperemos também nós algumas dessas memórias e revelações do saber fazer dos ferreiros. As portas e as aldrabas estão carregadas de simbologias. Luís Filipe Maçarico escreve que a porta é a «passagem do espaço público para o privado, a porta protege e guarda intimidades, que desvenda, quando se abre, traduzindo hospitalidade». O autor refere-se à porta de madeira, um material que requer arte para talhar. Neste ponto entra na conversa outro interlocutor, o presidente da Aldraba. José Alberto Franco faz referência a uma localidade, Miranda do Douro, onde as portas de madeira deram lugar ao alumínio pela «vergonha» que a velhinha porta de madeira pode transmitir, revelando épocas menos abastadas. Os dois intervenientes consideram que esta «vergonha» só poderá desaparecer quando as pessoas conhecerem o seu património, por isso a Aldraba tem promovido diversas iniciativas que visam divulgar esse património imperceptível e os espaço onde se insere.

Continuemos então a explorar o caderno temático. Aldraba é uma palavra com origem no árabe que significa «trinco», «ferrolho». Existem de diversas formas e cada uma delas acarreta consigo um significado. Luís Filipe Maçarico conta-nos algumas dessas curiosidades. «A mão está relacionada com a força protectora, quer do poder mundano, quer do poder místico. Invoca energia e a actividade. As flores evocam o efémero, a graciosidade, a harmonia e a paz. Muito outros há para explorar, mas qualquer um deles dá indicações do estatuto social da casa».

A Associação Aldraba foi constituída em 2005 e conta hoje 130 associados. Para José Alberto Franco, o património deve ser experienciado e é isso que a associação tem vindo a promover. Há mesmo um Roteiro das Aldrabas em Montemor-o-Novo, no Alentejo. As autarquias, associações locais e colectividades devem ter aqui um papel importante da difusão deste conhecimento. Mas é neste ponto que entra uma questão levantada por Luís Filipe Maçarico: «Quantos autarcas, construtores civis, arquitec tos e moradores conhecem a história social, cultural e simbólica dos artefactos, quando decidem e autorizam a morte da aldraba ou do batente em troca da aparição da porta de alumínio que descaracteriza aldeias, vilas, bairros e cidades?»

Já citámos em cima o exemplo de Miranda de Douro, onde portas de madeiras e aldrabas deram lugar ao frio e impessoal alumínio. Também de bons exemplos se faz este país, como sublinha José Alberto Franco. «Há municípios, como Faro, Loulé, Beja, em que houve a preocupação de não se perder a porta de madeira e dar lugar a portas de alumínio. Em Beja, o anterior autarca deu mesmo incentivos a quem quisesse recuperar casas mantendo as traças características».

Estes dois representantes da Aldraba confessaram ao Café Portugal que acreditam que este património tem ainda um lugar identitário no futuro, «que deixa memórias de sons, formas, cheiros, saberes e costumes», como reforça Luís Filipe Maçarico. Nesta sequência deixam uma questão: «Numa altura de desemprego e ‘novas oportunidades’ porque não formar pessoas nestes saberes artesanais, como é o ofício de ferreiro ou marceneiro? Há mercado para estes saberes se existirem produtos à venda com gosto».

O património imperceptível faz-se ainda com cataventos e platibandas, muito comuns no Algarve. As platibandas são pequenos muros erguidos na continuação da fachada, já junto ao tecto.

O caderno temático pode ser adquirido através da associação Aldraba.

2 comentários:

  1. Caros Amigos

    Parabéns a A Aldraba por ter sido citada por esse ENORME defensor do nosso património cultural, material e imaterial, que é o Rui Dias José. Parabéns ao Café Portugal por se nmanter na senda do enaltecimento do Portugal de todos nós.

    Abraço.

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