domingo, 31 de agosto de 2025

O acervo documental da Aldraba (28): Comércio



Retomando a divulgação do nosso acervo de textos publicados na revista "Aldraba" ao longo dos 37 números até agora editados, recordam-se hoje os artigos relativos ao tema das atividades comerciais:

Ana Alexandra Henriques, “A Mouraria, hoje”, nº 27 (Abr.2020), p.31

Glória Montes, “A lota de Lagos”, nº 9 (Out.2010), p.5

João Coelho, “Lojas com história e memórias”, nº 21 (Abr.2017), p.12

José do Carmo Francisco, “A mais pequena livraria do mundo”, nº 8 (Dez.2009), p.12

Luís Filipe Maçarico, “Joaquina e Eurico: a mercearia onde se sente o Alentejo”, nº 27 (Abr.2020), p.23

Nuno Roque Silveira, “A Feira da Ladra”, nº 7 (Jul.2009), p.5 

Os interessados em aceder a algum ou alguns destes textos podem manifestar-se através de uma simples mensagem para aldrabaassociacao@gmail.com, e teremos todo o gosto em lhes enviarmos cópia(s).

JAF

quinta-feira, 7 de agosto de 2025

20 expressões antigas do tempo das nossas avós


Reproduzido, com a devida vénia, de https://www.vortexmag.net/expressoes-antigas-da-lingua-portuguesa:

A língua muda, mas não esquece. E entre as tantas marcas que o tempo deixa no modo como falamos, há expressões que resistem como pequenas cápsulas culturais – formas de dizer que já não se ouvem com frequência, mas que continuam a fazer sentido.

Muitas dessas expressões eram comuns nos tempos das nossas avós. Algumas caíram em desuso, outras ainda se ouvem aqui e ali, mas todas revelam muito do humor, da criatividade e da sabedoria popular de outros tempos.

1. À noite todos os gatos são pardos

Quando a luz desaparece, tudo parece igual — ou mais difícil de distinguir. É isso que esta expressão ilustra: na escuridão, perdem-se as diferenças.

2. Andar à toa

Sem rumo, sem planos, apenas a seguir o tempo. Vem do mundo náutico: um barco à toa está a ser puxado, sem controlo próprio.

3. Armar aos cucos

Quem “arma aos cucos” tenta parecer mais do que é. A origem está na ave cuco, que põe ovos nos ninhos alheios — sem cuidar do que é seu.

4. Bater as botas

Uma forma informal de dizer que alguém morreu. A origem pode estar nos soldados que, caídos no campo de batalha, já não faziam as botas ecoar.

5. Chegar a roupa ao pelo

Não é apenas ralhar — é castigar com força. A imagem é clara: atingir alguém até ultrapassar o tecido e chegar à pele.

6. Dar com os burros n’água

Tentativa falhada. Recuo forçado. Segundo a lenda, vem de lavradores cujos burros se recusavam a atravessar um rio — acabando por cair à água.

7. Diz o roto ao nu!

Aponta a hipocrisia de quem critica sem ter moral para isso. Um pobre a rir-se de quem está ainda pior.

8. Fazer das tripas coração

Esforço extremo, sacrifício total. A imagem vem de rituais antigos, onde as tripas dos animais eram moldadas em forma de coração como oferenda.

9. Ir aos arames

Ficar furioso. Vem do mundo dos fantoches: quando os fios se enrolavam, os bonecos ficavam “fora de si”.

10. Lavar roupa suja

Discutir assuntos íntimos em público. Antigamente, lavava-se roupa nos rios — à vista de todos.

11. Meter o bedelho

Intrometer-se onde não foi chamado. O “bedelho” era uma haste usada para mexer brasas. Mal usada, podia provocar acidentes.

12. Meter o Rossio na Betesga

Quer fazer o impossível — como enfiar uma praça enorme numa rua minúscula. A expressão nasceu em Lisboa, entre o Rossio e a Rua da Betesga.

13. Não ter papas na língua

Fala o que pensa, sem rodeios. As “papas” dificultam o discurso — quem não as tem, não se cala.

14. Nascer com o rabo virado para a lua

Pessoa com sorte constante. Acreditava-se que nascer nessa posição trazia fortuna.

15. Pagar o pato

Assumir culpas que não são suas. No antigo “jogo do pato”, quem falhava tinha de compensar o dono do animal.

16. Pôr as barbas de molho

Ficar alerta. Os homens molhavam as barbas antes de se barbearem, para suavizar os pelos e evitar cortes.

17. Rachar a lenha

Trabalhar duro. Cortar lenha exige esforço físico — e é isso que esta expressão simboliza.

18. Tapar o sol com a peneira

Fingir que algo não existe. A peneira, cheia de buracos, não serve para esconder o sol — nem para encobrir verdades.

19. Ter o rei na barriga

Arrogância disfarçada de importância. Quem age como se tivesse o rei na barriga sente-se acima dos outros.

20. Tirar o cavalinho da chuva

Desistir de algo que se desejava. Se ninguém convida para entrar, mais vale tirar o cavalo da chuva e seguir caminho.


Estas expressões são heranças que, embora discretas, transportam história, modos de vida e formas de pensar. Resgatá-las é também uma forma de manter viva uma parte da cultura popular portuguesa – com graça, com memória e com muito da sabedoria das nossas avós.


segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Bilhete postal









O bilhete postal foi, durante mais de um século, uma forma de comunicação escrita muito popular, em especial pela sua simplicidade e pela sua tarifa muito acessível (durante décadas, custava em Portugal $50, ou seja, cinquenta centavos...), incorporada no preço de venda ao público do retângulo de cartolina, em cujo verso se escrevia a mensagem para o destinatário.

Historicamente, a ideia da sua criação terá sido lançada em 1865 por Henrique Stephan, diretor-geral dos correios da Alemanha, numa conferência internacional em Carlsrhue, tendo sido posta em prática pela 1ª vez pelos correios da Áustria, em 1 de dezembro de 1869, com enorme sucesso.

Em Portugal, o bilhete postal foi criado por decreto de 31 de outubro de 1877, assinado pelo Ministro das Obras Públicas, Comércio e Indústria, João Gualberto de Barros e Cunha (cf. Godofredo Ferreira, "Velhos Papéis do Correio", ed. CTT, 1949).

                                         *     *     *

Formou-se em 1996 um grupo musical português precário, com o nome de Rio Grande, que reuniu seis notáveis artistas - o Rui Veloso, o Tim (dos Xutos e Pontapés), o João Gil (dos Trovante), o Jorge Palma, o Vitorino e o João Monge. Registou grande impacto na altura, com um álbum com o mesmo nome do grupo, e um segundo em 1998 com o nome de "Dia de Concerto".

O maior sucesso dos Rio Grande, que ficou nas memórias de muitos de nós, foi o marcante "Postal dos correios", enviado por um qualquer migrante da Margem Sul (Barreiro, Almada, Cacilhas, Cruz do Pau?) aos seus pais numa recôndita aldeia alentejana. Aqui deixamos o belo texto dessa mensagem:

Postal dos correios

Querida mãe, querido pai. Então que tal? 
Nós andamos do jeito que Deus quer 
Entre dias que passam menos mal 
Lá vem um que nos dá mais que fazer 

Mas falemos de coisas bem melhores 
A Laurinda faz vestidos por medida 
O rapaz estuda nos computadores 
Dizem que é um emprego com saída 

Cá chegou direitinha a encomenda 
Pelo "expresso" que parou na Piedade 
Pão de trigo e linguiça pra merenda 
Sempre dá para enganar a saudade 

Espero que não demorem a mandar 
Novidade na volta do correio 
A ribeira corre bem ou vai secar? 
Como estão as oliveiras de "candeio"? 

Já não tenho mais assunto pra escrever 
Cumprimentos ao nosso pessoal 
Um abraço deste que tanto vos quer 
Sou capaz de ir aí pelo Natal

"Rio Grande", 1996